Fábio Nogueira de Miranda Filho
vez, Juízo mostra a crença de uma pes- soa pela afirmação e pelo julgamento da relação entre dois conceitos. A expressão verbal do juízo é a proposição. A opera- ção mais complexa, denominada Inferên- cia ou raciocínio, é a relação entre juízos com o fito de produzir uma conclusão. Sua expressão verbal é a argumentação.
O analista realiza estas operações inte- lectuais para buscar a verdade e, assim, subsidiar o decisor com informações corretas. A verdade seria a almejada cor- respondência ou adequação do pensa- mento com a realidade4. Dito de outra forma, a concordância integral da ima- gem formada pela mente de uma pessoa com o objeto real. No entanto, não há esta igualdade plena, mas somente cor- respondência entre os mundos: real, o objeto em si; do pensamento, o objeto representado na mente; e da linguagem, descrição do objeto (ALVES, 2011).
Sendo o homem falível, às vezes, toma o falso pelo verdadeiro. Desse modo, em relação à verdade, o espírito humano
pode encontrar-se nos seguintes esta- dos: ignorância, dúvida, opinião, certe- za e erro. O primeiro é a ausência de conhecimento, completa ou parcial. O segundo é o estado de equilíbrio entre duas afirmações contraditórias ou in- compatíveis; pode advir da prudência, da equiparação de prós e contras, da suspensão voluntária para melhor inves- tigar ou de puro ceticismo. No terceiro estado, afirma-se com algum receio de enganar-se, a verdade é provável. Já na certeza, não há receio em afirmar, e a verdade é percebida com evidências. Por último, no erro, o sujeito pensa que sabe, e não sabe que não sabe, e, por isso, não procura saber – ou seja, a pior situação em que o analista pode se encontrar. No quadro 1 abaixo, estão descritos os estados de espírito e quais são utilizados na Inteligência. A opinião e a certeza podem ser integradas direta- mente ao produto final da Inteligência, ao passo que a dúvida, após ser dirimida e transformada em opinião ou certeza, também pode ser integrada.
Quadro 1: Estado de espírito perante a verdade e utilização na Inteligência
Estado de espírito
Probabilidade de correspondência do pensamento com a realidade (verdade) em % aproximada
Utilização na atividade de Inteligência
Ignorância 0 – 49
Dúvida 50 – 89 (X)
Opinião 90 – 99 X
Certeza ~100 X
Erro 0
Fonte: elaborado pelo autor
4 O critério da verdade é o motivo maior que leva a mente a considerar tal situação como ver- dade. Estes critérios da verdade devem se estender a todas as verdades, serem objetivos e não necessitar eles mesmos de demonstração; caso contrário, haveria outro critério superior. Assim, a verdade não seria subjetiva. Alguns critérios já propostos são: autoridade divina, sen- so comum, princípio da contradição, evidência. Contudo, todos criticáveis em algum ponto. A verdade também não seria absoluta, pois, se assim o fosse, uma vez alcançada, a investiga- ção (científica) perderia completamente o sentido. Percebe-se que, no campo de estudos da Filosofia, a questão dos critérios da verdade é ainda polêmica.
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Ferramenta de interpretação de textos para o uso da inteligência
O analista, ao interpretar um texto, pre- cisa chegar a conclusões que se enqua- drem nos estados de espírito de opinião e certeza por meio das três operações in- telectuais listadas acima. Para ilustrar esta tarefa, Cooper (2005) apresenta a metá- fora do quebra-cabeça em que o analista não tem ideia de qual figura está sendo montada, não sabe se todas as peças es- tão disponíveis, e nem se as peças que possui são do mesmo quebra-cabeça. É neste ambiente, em que as principais pe- ças são textos, que o analista precisa das ferramentas apresentadas a seguir.
Ferramentas de Interpretação de textos
Ahermenêutica é a disciplina preocupada com a leitura correta dos textos ou com o estabelecimento da melhor interpre- tação de um texto. Algumas práticas da hermenêutica já são consagradas e não serão objeto de apresentação aprofun- dada por já serem de domínio público, além de serem largamente utilizadas em qualquer atividade interpretativa. Entre elas, podem-se citar: i) ler atentamente todo o texto, procurando focalizar a ideia central; ii) reconhecer os argumentos que dão sustentação a esta ideia, identi- ficar as objeções à ideia central; iii) sepa- rar os exemplos que foram empregados como ilustração das ideias principais; iii) parafrasear alguma ideia importante do texto e não permitir que prevaleçam suas ideias sobre as do autor; e iv) partir o texto em fragmentos (parágrafos ou par- tes) para melhor compreensão.
Não se pode esquecer de mencionar que, para a Semiótica, a pessoa interpreta um fato dentro do campo da sua experiência, buscando significação mais adequada que responda às suas necessidades e à sua formação cultural. A tendência é cada um ver o que pode ver e para o que foi pre- parado para ver (ALVES, 2011)5. Desse ponto de vista, quanto mais eclético for o analista, melhor será sua interpretação.
O objeto teórico da lógica
é o estudo das normas do pensamento correto. Dito de outra forma, a lógica estuda as condições objetivas e formais para justificar a verdade, mas não cuida da própria verdade – objetivo pertencente a outras ciências, como matemática, biologia, antropologia, economia, etc.
A primeira técnica exibida é a Inferência, basilar para qualquer interpretação por parte do analista de Inteligência. Em se- guida, é apresentada a Análise de Con- teúdo e suas evoluções por meio de pro- gramas de computador, úteis para testar hipóteses e descobrir novas tendências. Por último, vem a Análise de Discurso, uma técnica ainda experimental que se configura como uma alternativa de análi- se para grandes conjuntos de textos.

5 Kahneman (2012) também aborda o assunto de tirar conclusões precipitadas com base em evidência limitada ao introduzir o conceito de “o que você vê é tudo que há” (WYSIATI – What youseeisallthereis). Por esse entendimento, o analista não procuraria outras informações que possam elucidar o problema, se atendo somente ao que já conhece.
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Fábio Nogueira de Miranda Filho
Inferência
O objeto teórico da lógica é o estudo das normas do pensamento correto. Dito de outra forma, a lógica estuda as condições objetivas e formais para justi- ficar a verdade, mas não cuida da própria verdade – objetivo pertencente a outras ciências, como matemática, biologia, antropologia, economia, etc. Assim, a importância da lógica reside no fato de que, por meio dela, é possível evitar ilu- sões decorrentes da força da semântica e polissêmica das palavras nos discursos. Independente de belas palavras, se uma argumentação fere as leis da lógica, sua conclusão é inevitavelmente falsa. Esta técnica permite avaliar o pensamento de outrem, bem como construir correta- mente seu próprio pensamento.
Os princípios da lógica (princípio da identidade, de contradição, do tercei- ro excluído e de razão suficiente) são leis universais que balizam se um pen- samento está correto ou não. A lógica nos ensina como proceder para ter um pensamento válido. Sem prejuízo das operações mentais “conceito” e “juízo”, para o analista de Inteligência, a utilidade máxima da lógica está na inferência, que pode ser imediata ou mediata. Esta últi- ma se subdivide em dedutiva (silogismo) e indutiva (ALVES, 2011).
A inferência imediata é aquela em que se tira uma conclusão de uma propo- sição dada, sem recorrer a um terceiro termo (proposição intermediária). Por exemplo, se é falso que “todo muçulma-
no é terrorista”, então é verdadeiro que “algum muçulmano não é terrorista”; “algum agente de Inteligência é esperto, logo, algum agente de Inteligência não é obtuso”; outro exemplo, neste caso para evidenciar que a conclusão é invá- lida “o separatista pode ser terrorista, logo é terrorista”. As inferências imedia- tas podem ser realizadas por oposição, conversão, obversão, contraposição e equivalência. A leitura atenta de um ma- nual de lógica ensina, sem grandes di- ficuldades, como aplicar este raciocínio em quaisquer proposições 6
Por sua vez, a inferência mediata parte de duas ou mais verdades para concluir outra delas decorrente. Aqui há uma proposição intermediária que possibilita a conclusão. O primeiro tipo, dedução, consiste em concluir uma terceira pro- posição de duas outras dadas, indo dos princípios para a consequência, do geral ao particular. Há certeza lógica da con- clusão, que, de certa forma, já está pre- sente nas premissas. A conclusão dedu- tiva não ultrapassa a força das premissas, não desenvolve um conhecimento novo, contudo carrega em si a convicção. A dedução é útil para o analista demonstrar a verdade, ou, de outra forma, verificar se o texto possui demonstração correta da verdade. Um exemplo de dedução seria: todo homem-bomba é terrorista; ora, esta pessoa é homem-bomba; logo, esta pessoa é terrorista. O principal tipo de raciocínio dedutivo é o silogismo. Seu princípio fundamental é que o que é afir- mado ou negado do todo, é afirmado ou negado das partes desse todo.
6 Para uma compreensão ampla sobre os elementos para o discurso jurídico, ver a obra intitu- lada Lógica – Pensamento Formal e Argumentação, de Alaôr Caffé Alves, Ed. Quartier Latin, 5° Ed., 2011.
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Ferramenta de interpretação de textos para o uso da inteligência
A crítica que se faz ao pensamento dedu- tivo é que ele não agrega novidades às ci- ências, porém sua utilidade está em clari- ficar a demonstração de uma descoberta já realizada ou, ainda, evidenciar todas as consequências lógicas possíveis de uma nova tese apresentada, mesmo aquelas não-desenvolvidas pelo próprio autor.
Por outro lado, a falácia é o raciocínio dedutivo incorreto com aparência corre- ta, também chamada de sofisma se for construída de forma intencional para inclinar vontades ou iludir o destinatá- rio. O sofisma pode ser realizado por: i) equívoco: toma-se, na enunciação, a mesma palavra em dois sentidos diferen- tes (ex.: o agente espiona; ora, o agente é uma pessoa que intermedia negócios; logo, uma pessoa que intermedia negó- cios espiona); ii) tautologia: a conclusão, escrita de outra forma, repete a premis- sa (ex.: agência de inteligência é órgão especializado em coleta de informações, ora Abin é agência de Inteligência; logo, Abin é órgão especializado em coleta de informações); iii) infração de regras da lógica (ex.: algum praticante do Islã é terrorista, logo todo terrorista é pra- ticante do Islã.); iv) pelo conteúdo falso da premissa (ex.: todo espião rouba; ora, quem rouba deve ser preso; logo, todo espião deve ser preso).

O segundo tipo de inferência mediata é a indução, que, diferentemente da ante- rior, não parte de ideias universais, mas sim de fatos empiricamente observados em busca de uma conclusão, mesmo que temporária. Tenta-se generalizar, do particular ao geral, uma relação de causalidade entre dois fenômenos, to-
mando-se como base a experiência de dados parciais suficientemente enume- rados. A conclusão indutiva amplia o conhecimento do homem, porém não traz a mesma certeza da dedutiva, pois pode ser alterada no futuro, caso novas experiências assim o comprovem. A re- lativa segurança da conclusão indutiva se baseia no princípio da regularida- de da natureza: as mesmas causas, em determinadas circunstâncias, produzem os mesmos efeitos. Cabe a ressalva de que, nas ciências sociais, é muito difícil encontrar-se um grupo que represente suficientemente o todo. O analista de Inteligência deve ficar atento a isso para não cair em armadilhas.
A argumentação indutiva pode ser for- mada por analogia, pela enumeração total ou incompleta, pela razão contrá- ria ou pela razão semelhante de uma conclusão já aceita. A seguir, alguns exemplos de indução: “um espião é um infrator; ora, a polícia ajudou a prender um espião; logo, com mais razão, a po- lícia ajudará a prender um infrator que seja espião e sabotador”; “um ofício se aprende estudando; ora, o analista de Inteligência aprende seu ofício estudan- do a doutrina de Inteligência; logo, um leigo também aprenderá o ofício da In- teligência estudando esta doutrina”; “a realização do ato terrorista ameaça a vida; ora, a ameaça à vida amedronta as pessoas; logo, a realização do ato terro- rista amedronta as pessoas, e também, logo, a não-realização de ato terrorista não causa temor às pessoas”.
Da mesma forma que no método dedu- tivo, a indução apresenta sofismas, por
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Fábio Nogueira de Miranda Filho
exemplo: “os SIs da Europa combatem o terrorismo; ora, o terrorismo é uma atividade ilegal; logo os SIs da Europa combatem todas as atividades ilegais”. Este erro pode ser por observação ine- xata, considerar uma coincidência como causa, tomar a causa parcial como total ou levar em conta uma lista insuficiente. Nota-se que o analista deve se preca- ver para não inferir o que não é possí- vel, mas também deve ser ousado. Veja a seguinte premissa: “os atentados ter- roristas nos Estados Unidos ao World Trade Center em 1993, de Oklama City em 1995, de 11/09 em Nova Iorque, da Maratona de Boston em 2013 causaram comoção neste país”. O analista pode in- ferir que atentados semelhantes a esse, perpetrados no futuro, também causa- rão comoção nos EUA. Ele pode ir mais além e julgar que atentados como esse causarão comoção em outros países oci- dentais. Contudo, seria temeroso afirmar que atos como esse causarão comoção no mundo todo, visto que alguns países não simpatizam com os Estados Unidos.
Em um texto argumentativo comum, como notícia de jornal, discurso de au- toridade, relato de fonte ocular etc., premissas e conclusões não aparecem destacados como nos exemplos acima. Ao contrário, estes elementos estão espalhados pelo texto e, muitas vezes, camuflados. O analista precisa encontrá- -los e verificar se trata-se de raciocínio correto ou sofisma, e também, a partir das premissas apresentadas no texto, es- tabelecer suas próprias conclusões, obe- decendo às regras da lógica. Na argu- mentação, geralmente são consideradas
verdades os lugares-comuns, opiniões aceitas pela comunidade e pontos de vis- ta consagrados. As partículas indicado- ras de premissas podem ser: ora, já que, porque, dado que, visto que, pois etc. Para conclusões, podem ser: logo, por conseguinte, portanto, assim, por isso, consequentemente, desse modo etc. Duas observações se fazem importantes: as partículas indicadoras podem estar ocultas, e a conclusão pode vir antes das premissas.
Análise de Conteúdo e Ferramentas Computacionais
A Análise de Conteúdo (AC), definida como conjunto de técnicas de análise de comunicações, foi utilizada inicialmen- te nos EUA no séc. XIX. Já na Primeira Guerra Mundial, foi utilizada para ana- lisar propagandas inimigas e, durante a Segunda, para analisar jornais suspei- tos de praticarem subversão, diga-se, apoiarem o nazismo.
A AC é realizada da seguinte forma: i) formulação de hipóteses e objetivos7 ; ii) escolha dos documentos por tempo, quantidade, assunto, e de acordo com o objetivo; iii) leitura atenta e aberta a ideias do(s) texto(s) para estabelecimento de unidades de registro (palavras, frases, enunciados, temas), ou seja, os indicado- res que fundamentem a hipótese – estes podem ser testados em pequenas passa- gens de texto; iv) escolha do contexto da unidade de registro, por exemplo, frase para palavra, parágrafo para tema, texto para tema, texto para palavra; v) categori- zação das unidades de análise (qualidade
7 É possível fazer um estudo exploratório sem o guia das hipóteses.
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Ferramenta de interpretação de textos para o uso da inteligência
das categorias: exclusão mútua, homoge- neidade, pertinência, objetividade e pro- dutividade); vi) estabelecimento de regras de enumeração, isto é, como as unidades de registro serão contadas; vii) realização da contagem das unidades de registro e apresentação dos resultados em tabela(s) de dupla ou única entrada; viii) inferência do cruzamento de dados da(s) tabela(s), sendo possível análise quantitativa e qua- litativa (BARDIN, 1977).
De modo geral, a AC é útil ao analista de Inteligência para avaliar a tensão en- tre países por meio dos discursos, iden- tificar ideologias de veículos de comuni- cação, estudar motivações de opiniões, descobrir tendências de acontecimentos, estudar o perfil de uma pessoa, etc. A AC se arvora de neutralidade, legitimada na ciência estatística, no intuito de con- firmar uma interpretação ou mostrar um caminho novo a ser percorrido pelo ana- lista. Bardin (1977) expõe várias técni- cas que privilegiam algum aspecto a ser avaliado, o que não impede de conjugá- -las na aplicação da AC. A seguir, são apresentadas quatro técnicas de análise a título de ilustração.
técnica, a linguagem representa e reflete diretamente aquele que a utiliza. Aqui é avaliada a atitude do autor ou veículo de comunicação para com coisa, pessoa, ideia, acontecimento etc. A atitude pos- sui direção que é a favor, contra, neutra ou ambivalente (ora a favor, ora contra) e intensidade que pode ser forte, fraca ou em escala de pontuação. Deve-se evitar que o analista projete seu próprio siste- ma de valor e contamine a avaliação.
A segunda técnica é a enunciação, mais indicada para entrevistas não-diretivas. Aqui o contexto é cada entrevista, e as unidades de registro podem ser frequên- cia do tema, forma dos encadeamentos das proposições para evidenciar raciocí- nios e progressão do discurso pelo se- quenciamento da mudança de assunto. Por exemplo, aqui são analisadas as fi- guras de retórica: i) recorrências (repe- tição de um mesmo tema ou palavra em contextos diferentes) que podem indicar importância para o autor, ou que o au- tor não sabe o que quer, ou ainda que o autor precisa convencer a si mesmo ou alguém; ii) lapso (quando dizemos algu- ma coisa sem querer) que demonstra a
A mineração de dados tem
sua utilidade prejudicada pelo fato de a maioria dos dados de interesse da Inteligência não se apresentarem estruturados, como textos de notícias, blogs, chats e livros.

A primeira análise é de avaliação, que visa a medir as atitudes do autor quanto aos objetos a que ele se refere. Para esta
manifestação insistente e indomável de uma ideia negada; iii) ilogismo acompa- nhado da perda de domínio do discurso que pode corresponder a má-fé; iv) uso de lugar comum que busca adesão do in- terlocutor; v) uso de metáfora que tenta reduzir a tensão e possui grande poder de sugestão por suscitar mais emoção do que razão etc.
A análise da expressão, terceira técnica, parte do pressuposto de que existe cor- respondência entre o tipo do discurso e
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as características do seu locutor. Os indi- cadores normalmente são: i) número de palavras diferentes / número total de pa- lavras; ii) (verbos + advérbios) / (subs- tantivo + adjetivo) em que > 1 indica pessoa dinâmica e < 1 pessoa descriti- va; iii) número de palavras que exprimem mal estar / número de palavras que expri- mem descontração, para medir a tensão; iv) número de palavras na frase; número de frases incompletas (válido para textos orais). Esta técnica é particularmente útil para verificar a autenticidade de discurso, porém traz a crítica que cada ocorrência possui o mesmo peso, em prejuízo da avaliação qualitativa (BARDIN, 1977).
A última técnica, das relações, procura verificar a ocorrência ou não de duas ou mais unidades de registro em uma mes- ma unidade de contexto. Estas unidades de registro podem se atrair, se inibir, ou não estar relacionadas. É útil para clari- ficar as representações sociais e ideolo- gias do autor. A dificuldade é comparar o número de ocorrências encontrado com o que seria normal ou esperado para de- terminado autor.
Nota-se que a AC foi criada para ser re- alizada manualmente, o que claramente a tornava lenta e imprecisa, caso não se conseguisse quantidade suficiente para amostragem dos textos. Com o advento da computação, especialmente a partir da década de 1960, a AC deu um sal- to de qualidade com o desenvolvimento de vários programas de computador que
auxiliavam a contagem das unidades de registro, bem como sua forma de apre- sentação dos resultados, facilitando a in- ferência do analista. O número de unida- des de contexto, em sua maioria textos, ampliou consideravelmente.
A primeira evolução computacional, per- tinente à análise de textos, foi a Mine- ração de Dados (Data Mining), definida como o processo de descoberta de pa- drões úteis em grandes bancos de dados (HAN; KAMBER, 2001). Em primeiro lugar, juntam-se os dados de diversas fontes em um único local, o banco de dados (Data Warehouses), em formato- -padrão que possa ser usado como en- trada para as ferramentas de análise. Dito de outra forma, os dados, planilhas, textos etc. encontram-se normatizados e estruturados8. Em seguida, submete- -se a base de dados a algoritmos que buscam padrões que possam interessar ao pesquisador. O uso mais comercial da mineração de dados é em empresas, sendo o exemplo mais conhecido aquele que prevê a venda de um produto asso- ciado a outro, como fralda e cerveja. Na Inteligência, é possível usar a mineração de dados em bancos de dados internos ao SI em que é possível normatizá-lo, ou em bancos de dados de segurança públi- ca, que já possuem certa normatização.
Vale a pena mencionar que a minera- ção de dados se vale de funcionalidades da área de Aprendizagem de Máquina, ramo da inteligência artificial, especiali-
8 Dados estruturados são aqueles em que um mesmo grupo de dados possui os mesmos atri- butos, por exemplo, o endereço de residência terá o dado endereço, que possui o atributo de ser texto, o dado número, que será somente números, não aceitando texto, o dado bairro, novamente texto e o dado CEP que aceitará apenas números. O mesmo exemplo do ende- reço em forma não-estruturada será um dado de texto em que todas as informações estarão inseridas, porém sem ordem de aparecimento ou crítica quanto a número ou texto.
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Ferramenta de interpretação de textos para o uso da inteligência
zada no estudo e construção de sistemas que sejam capazes de aprender de for- ma automatizada a partir de experiências anteriores. Neste caso, o analista cria exemplos que servem de guia para que o software“apenda” o que procurar.
A mineração de dados tem sua utilidade prejudicada pelo fato de a maioria dos dados de interesse da Inteligência não se apresentarem estruturados, como textos de notícias, blogs, chats e livros. Assim, a tecnologia mais próxima de AC é a mi- neração de textos, processo que visa a descobrir padrões não-explícitos, váli- dos, singulares, compreensíveis e úteis a partir de documentos textuais (SONG; YI-FANG, 2009). A mineração de textos, especialização da mineração de dados, é útil para a Inteligência, por exemplo, no monitoramento de pessoas, grupos (se- paratistas, terroristas) e temas, seleção de textos por assunto e, enfim, nas apli- cações já vistas proporcionadas pela AC.
resumo responde à pergunta do analista. A segunda técnica, Extração de Informa- ção, faz identificação de elementos e re- lativa estruturação de dados do texto. Os elementos que podem ser extraídos de textos são: i) entidades, como pessoas, locais, empresas etc.; ii) os atributos ou características das entidades; iii) fatos, que são as relações existentes entre enti- dades, como, por exemplo, pessoa per- tence a determinado grupo; e iv) even- tos que são as atividades que as pessoas participam, como atentado terrorista ou treinamento com armas. Outra técnica é a classificação de documentos ou partes de documentos em categorias pré-de- finidas pelo analista. Já a clusterização
,
agrupa o conjunto de textos de tal for- ma que os itens de dados presentes em um clustersão semelhantes entre si. Isto permite encontrar grupos naturais de textos, antes desconhecidos do analista.
A última técnica a ser descrita é a mine- ração de opiniões que realiza a análise de sentimentos e se assemelha a técnica
Por isso, o analista continua imprescindível na tarefa de interpretar textos. Desde o estabelecimento de hipóteses, baseado na sua experiência, no seu instinto de que algo deve ser investigado, [...]

A mineração de textos também pode ser realizada por diversas técnicas. A pri- meira delas é a sumarização, que pode ser feita a partir de um único texto ou de vários. Ela pode ser genérica, em que apenas as ideias principais do texto são apresentadas, ou específica, em que o
de avaliação da AC. O objetivo é iden- tificar as opiniões expressas em textos, mais comum em notícias e redes sociais, sobre determinado alvo e classificar a orientação desta opinião, se positiva, ne- gativa, neutra ou ambivalente, ou, ainda, descrever a emoção da pessoa perante o alvo, como raiva, medo, tristeza, surpre- sa, alegria etc. O alvo pode ser qualquer tipo de entidade, como pessoa, evento ou país. Destaca-se que também a mi- neração de textos se utiliza da Aprendi- zagem de Máquina.
Há, no mercado, inúmeros softwares que realizam a mineração de dados e de tex- tos nas mais diversas técnicas e algorit-
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mos. A grande dificuldade de se utilizar a computação para tratar textos está em se lidar com a linguagem natural. Tratar situações como as seguintes pode levar a erros de interpretação: negativa da ne- gativa, resolução de pronome, sinonímia, homonímia, polissemia, ironia, estabele- cimento de pesos para ideias positivas e negativas no mesmo texto, ideias implí- citas, opiniões sobre múltiplos alvos no mesmo texto, discurso indireto. Soma-se a isso o fato de que softwares que lidam com a língua portuguesa são bem mais escassos do que aqueles que se ocupam da língua inglesa.
Por isso, o analista continua imprescindí- vel na tarefa de interpretar textos. Desde o estabelecimento de hipóteses, basea- do na sua experiência, no seu instinto de que algo deve ser investigado, passando pelo trabalho de estabelecer os parâme- tros corretos para que o software possa encontrar o padrão que mais interessa, até na análise final do que foi apresenta- do pelo programa de computador.
Análise de Discurso
Inicialmente, a Análise de Discurso (AD) foi classificada como mais uma técnica de AC por Bardin (1977). Para ele, a AD era de difícil aplicação e previa cálculos matemáticos complexos que não trariam resultados úteis para a interpretação. Contudo, a partir de estudos de Pêcheux (1975), no final da década de 1960, sobre materialismo histórico, linguísti- ca e psicanálise, esta técnica, ainda em desenvolvimento nos dias atuais, cris- talizou-se como uma forma diferencia- da de interpretar textos, principalmente aqueles com viés político. A AD procura
entender e explicar como se constrói o sentido de um texto e como esse texto se articula com a história e a sociedade que o produziu (GREGOLIN, 1995). Ou seja, analisa o ato de produzir um enun- ciado, visto como um processo, e não o texto de um enunciado, seu produto (BRANDÃO, 2004) - como é compre- endido pela interpretação tradicional. Assim, a AD é definida pelo estudo lin- guístico das condições de produção de um discurso (BRANDÃO, 2004).
Para entender melhor esta definição de AD, cabe explicar o que são as condi- ções de produção, o discurso em si e outros termos correlatos. Por condições de produção do discurso compreende- -se o conjunto de elementos que cerca esta produção: contexto histórico-social, os interlocutores, as imagens que fazem de si, do outro e do assunto de que estão tratando (BRANDÃO, 2004). A condi- ção de produção é baseada também no poder e no lugar de onde se fala, isto é, na posição institucional do produtor do discurso, por exemplo, professor, padre, especialista consagrado, etc. (ORLAN- DI, 2001). Por sua vez, o discurso é entendido como toda atividade comuni- cativa entre interlocutores (BRANDÃO, 2004). Todo discurso produz senti- dos que expressam as posições sociais, culturais e ideológicas dos sujeitos. O discurso “é uma arena de lutas em que locutores, falando de posições ideoló- gicas diferentes, procuram interagir e atuar uns sobre os outros” (BRANDÃO, 2004, Pág. 9).
Foucault (1969) define discurso de modo mais abrangente, introduzindo mais um conceito chave para a AD: é o conjunto
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Ferramenta de interpretação de textos para o uso da inteligência
de enunciados que se remetem à mes- ma formação discursiva. Então, formação
discursiva é o conjunto de enunciados ou textos marcados por algumas caracterís- ticas comuns: linguísticas, temáticas e de posição ideológica (BRANDÃO, 2004). Em outras palavras, é aquilo que, numa formação ideológica dada, a partir de uma posição do autor dada, em uma conjuntura sócio histórica dada, deter- mina o que pode e deve ser dito pelo falante (ORLANDI, 2001). Um texto pode ter várias formações discursivas, mas somente uma predominante; e uma formação discursiva pode trazer dentro de si outras formações discursivas, seja a favor ou contra ela mesma. Para Pêcheux (1975), a formação discursiva é hetero- gênea e fundamentalmente instável.
para a ideologia. A primeira, geral, é me- diadora da integração social e da coesão
do grupo. Ela perpetua um ato funda- dor, o que confere a um grupo social a imagem de si mesmo; é dinâmica e mo- tivadora da práxis social; é simplificadora e esquemática, sua forma de expressão preferencial são as máximas, frases de efeito, fórmulas reconhecidas, etc.; é operatória e não-temática, é a partir dela que pensamos mais do que podemos pensar sobre ela; é conservacionista e resistente às modificações.
A segunda função, dominação, é ligada a aspectos hierárquicos da organização social. Neste caso, como a legitimação da autoridade demanda mais crença do que os indivíduos podem dar, surge a ideologia como sistema justificador da
O analista deve construir seu próprio dispositivo analítico a partir da questão que ele coloca em face dos materiais de análise. Isto implica estabelecer hipóteses, delimitar a amplitude de tempo e selecionar os textos iniciais a serem analisados.
A formação discursiva está inserida den- tro de uma formação ideológica. Esta nada mais é do que o conjunto de atitu- des e representações ou imagens que os falantes têm sobre si mesmos e o assunto em pauta. Por exemplo, formação ideo- lógica de uma seita religiosa, ou de um grupo separatista. Para entender melhor
a formação ideológica, recorre-se ao conceito de ideologia dado por Ricoeur (1977). Este autor admite três funções
dominação, às vezes, com caráter de distorção e dissimulação. Por último, a função de deformação, em que entra o papel negativo já declarado por Marx e Engels (1965). É a forma de a classe do- minante, que já possui hegemonia mate- rial, também dominar o espiritual.
Dessa maneira, a ideologia interpela o indivíduo a levá-lo, sem que ele tome consciência disso. Ao contrário, faz com que tenha a impressão de que é senhor da própria vontade, a ocupar seu lugar em um dos grupos ou classes de uma de- terminada formação social (PÊCHEUX, 1975). Dito de outra forma, a ideolo- gia ou, antes, a formação ideológica determina características da formação discursiva. É necessário lembrar que o próprio analista está preso a uma ideo- logia, o que o impediria de ter o correto distanciamento para interpretar o texto (RICOEUR, 1977)9 .

9 Todo saber está baseado num interesse, e esse interesse funciona como uma ideologia (RICOEUR, 1977).
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Fábio Nogueira de Miranda Filho
A figura 1 a seguir retoma esquematica- mente os conceitos envolvidos na AD. Neste exemplo, a AD estudaria as con- dições de produção dos discursos 1, 2, N que pertencem à Formação Discursiva 1 (FD-1), que está inserida na Forma- ção Ideológica 1 (FI-1). Nota-se que os discursos da FD-1 sofrem influência da
FD-2, a qual pode ser ligeiramente dife- rente, ou diametralmente oposta a FD-1, contudo ambas obedecem aos preceitos da FI-1. As linhas que delimitam as FDs estão tracejadas para reforçar que são instáveis; ao contrário, a linha contínua das FIs indica que suas ideias são mais rígidas e tendem a se perpetuar.
Diagrama 1: Esquema de conceitos envolvidos em AD
Formação Discursiva
Formação Discursiva 1 (FD-1)
2 (FD-2) Discurso 1
Discurso 2
Discurso N
Formação Discursiva N (FD-N)
Formação Ideológica (FI-1)
Formação Ideológica (FI-N)
Condições de Produção da FD-1
Fonte: elaborado pelo autor
Ao contrário da interpretação costumei- ra que toma a frase e, às vezes, a palavra, como unidade de análise, a AD toma o texto como sua unidade. Este objeto complexo fez com que a AD tomasse vá- rias direções, como a Análise Crítica do Discurso, desenvolvida por Fairclough (2001). Estes caminhos levaram a AD a diferentes concepções epistemológicas e também metodológicas. Do ponto de vista da Inteligência, a AD ainda care- ce de formatação e teste de um método final que permita ao analista usar este referencial teórico na interpretação de textos. Mesmo que este método tenha
de se adaptar ao tipo de questionamento do analista, faz-se mister o estabeleci- mento de parâmetros mínimos a serem seguidos na investigação.
Desse modo, com o fito de pavimentar um caminho a ser seguido pelo analista, principalmente pela característica prag- mática da Inteligência, apresenta-se a metodologia para aplicação da AD a se- guir. Em primeiro lugar, esclarece-se que a AD não se justifica para análise de um único texto, pois seu custo alto para o SI a inviabilizaria, além do fato de que o resultado para este caso seria bastan-
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Ferramenta de interpretação de textos para o uso da inteligência
te semelhante à interpretação comum. A partir dessa premissa, a AD é reco- mendada para um conjunto de textos, de preferência políticos, e normalmente ao longo de um período histórico definido. A AD é idealmente um empreendimento multidisciplinar, envolvendo ciências so- ciais, como linguística, sociologia, histó- ria e ciência política.
O analista deve construir seu próprio dispositivo analítico a partir da questão que ele coloca em face dos materiais de análise. Isto implica estabelecer hipóte- ses, delimitar a amplitude de tempo e selecionar os textos iniciais a serem ana- lisados. O analista, na leitura desses tex- tos, realizará duas análises em paralelo, a de texto e a da produção do discurso. Ao longo da leitura e da análise, novos textos podem ser incorporados ao cor- pus, e as perguntas da pesquisa também podem ser alteradas de acordo com os achados iniciais.
Recuperando-se o conceito de unidade de registro da AC, o texto, que é a ope- racionalização do discurso, é a unidade de registro da AD. A análise do texto compreende a sua descrição, em que são estudados os seguintes elementos: i) interação: como se dão as interações entre os atores envolvidos e quem as controla; ii) argumentação: quais são os argumentos citados para defender a opi- nião do autor, e quais argumentos con- trários já são rebatidos; iii) sociabilidade: descrição das relações sociais entre os participantes e quais são suas identida-
des sociais; assunto: quais temas são abordados e quais são as palavras-chave; iv) vocabulário: identificação de criação de palavras, das metáforas usadas, do uso da voz passiva e da nominalização de processos10; v) inferência: que conclu- sões podem ser tiradas do texto. Estes dados devem ser tabulados para melhor controle e avaliação.
A segunda análise, da produção do dis- curso, tem caráter interpretativo, e é ela que torna a AD diferente da interpre- tação comum. A partir das característi- cas do texto elencadas na etapa descri- ta anteriormente, inicia-se a montagem do quadro da prática discursiva. Aqui é necessário identificar: i) formação(ões) discursiva(s) presentes no texto; ii) formação(ões) ideológica(s) a que per- tencem tanto os textos quanto as forma- ções discursivas; efeitos da reprodução e da circulação desses discursos; iii) con- texto histórico-social vigente na época dos discursos – isto é, as estruturas so- ciais hegemônicas ou não que se mani- festam nos discursos, o quadro das ins- tituições em que o discurso é produzido e os embates históricos, sociais etc. que cristalizam-se no discurso.
O produto da análise é a compreensão dos processos de produção de sentidos e de constituição dos sujeitos em suas posições (ORLANDI, 2001). Para a In- teligência, o resultado é utilizado como evidência da ação ou intenção de agir, seja de um grupo ou país, em determi- nada conjuntura. A seguir, são apresen-

10 A criação de palavras indica a tentativa de introduzir novos conceitos. As metáforas dão dicas de qual viés ideológico é seguido, a voz passiva permite a ocultação do agente, e a nominali- zação do processo o coloca em segundo plano, tornando agente e paciente implícitos. Ambas as situações devem ser investigadas para verificar se houve razões ideológicas.
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Fábio Nogueira de Miranda Filho
tadas três situações que ilustram como a AD pode contribuir na tarefa do analista de entender os fatos e antecipar perigos.
O primeiro exemplo é a formação dis- cursiva e ideológica criada nos EUA no pós-atentados de 11/9 de 2001 perpe- trados em Nova Iorque, em que se divul- gou a noção de que o terrorismo era a nova ameaça global e que todos os pa- íses deveriam se juntar aos EUA nessa cruzada11. Os discursos foram lançados por meio de artigos acadêmicos, prin-
cipalmente nos temas Ciência Política, Defesa e Inteligência, na imprensa de forma massiva e generalizada, nos dis- cursos oficiais de autoridades, enfim, a partir de qualquer comunicação que tra- tava da segurança dos países. A avalan- che de discursos foi tão grande que se tornou constrangedor a qualquer analista de segurança, seja civil, militar, ligado a governo ou à iniciativa privada, externar opinião de que o terrorismo não era a maior ameaça global nestes tempos. Pra- ticamente não houve vozes dissidentes. Houve aqui o que se chama de cascatas de disponibilidade, ou seja, um evento é exagerado pela imprensa e pelo público a ponto de se tornar a única coisa sobre a qual se fala, influenciando a definição de políticas públicas (KAHNEMAN, 2012).
O Brasil, inclusive, sentiu o impacto dessa formação discursiva, e foi criado, em 2008, o Departamento de Contra- terrorismo dentro da estrutura da Abin. Cumpre destacar que esta formação dis- cursiva está vigente até os dias atuais,
mesmo em países que não apresentam essa realidade de ameaças terroristas. O acompanhamento dessa temática, com o ferramental da AD, torna-se necessário para se verificar sua evolução.
O segundo exemplo versa sobre o em- bargo econômico norte-americano a Cuba. Nos idos de 1959, com a Revolu- ção Cubana, este país passou a represen- tar ameaça ao sistema capitalista liderado pelos EUA. Já no ano de 1960, e depois em 1962, iniciaram-se as primeiras res- trições comerciais entre os países. Desde então, comércio, investimentos, viagens a turismo e negócios ficaram prejudica- das. A partir do esfacelamento da URSS em 1991, sua sucessora, a Rússia, não podia mais auxiliar Cuba financeiramen- te. Porém, sempre restavam acusações sobre violações a direitos humanos e fa- vorecimento, até treinamento, a espiões a serviço de países hostis aos america- nos, como forma de justificar o embargo. Do lado contrário, recentemente, Cuba também acusa os EUA de violações a convenções internacionais no caso da prisão de Guantánamo.
Desde a década de 1960, cada presi- dente americano apresentou sua forma- ção discursiva, com alguns pontos em comum, entre eles, manter o embargo econômico à ilha caribenha. Contudo, o presidente Barack Obama se portou diferente, chegando a receber o prêmio Nobel da paz em 2009, além de fazer as negociações com o Irã avançarem, ser contra nova intervenção terrestre no
11 Vale lembrar que, no período de história recente, os EUA se preocupavam, quanto à política externa, com a União das Repúblicas Socialistas Soviética (URSS) até 1991, ano da dissolu- ção do maior país comunista do mundo. Nos 10 anos seguintes, a preocupação dos EUA se voltou ao oriente médio e ao controle sobre a produção de petróleo.
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Ferramenta de interpretação de textos para o uso da inteligência
Iraque, e a favor do desmantelamento da prisão de Guantánamo. A partir de seu segundo mandato, ele mudou seu discurso em relação a Cuba, acenan- do com a abertura, principalmente por meio de discursos oficiais. Desde o final de 2014, o presidente americano vem anunciando medidas que sinalizam o fim do embargo, ainda que pese a necessida- de de aprovação do congresso america- no. Assim, a análise com instrumental da AD teria gerado pistas para antecipação do movimento americano de abertura frente ao embargo econômico a Cuba, mesmo antes das primeiras ações con- cretas em direção ao fim do bloqueio co- mercial. Estes sinais seriam confrontados com outras evidências para se chegar a conclusões mais assertivas.
venda clandestina de petróleo, saques e resgates de reféns. Contudo, dinheiro também não foi problema para grupos como a Al Qaeda, e, nem por isso, con- seguiram o mesmo sucesso em conquis- tar novos combatentes.
O mundo vê como atrocidade e contras- senso as várias decapitações, massacres, execuções, capturas de pessoas como escravos, apedrejamentos, etc. pratica- das por membros desse grupo salafista, vertente do Islã. E essas mesmas imagens é que são usadas no recrutamento de no- vos integrantes, seja para lutar na Síria e no Iraque, ou para atuarem no estrangei- ro, como recrutadores ou para compor células terroristas. A grande pergunta é como esse material que causa tanto asco ajuda a convencer pessoas sem históri-
De modo geral, os analistas tendem a escrever mais sobre conhecimentos, que são verdades já avaliadas, e os decisores preferem notícias, que são verdades a serem avaliadas.

O terceiro exemplo, mais complexo, nos remete ao mundo islâmico, mais especi- ficamente à propaganda para aliciamen- to de novos membros para o Daesh, mais conhecido como Estado Islâmico. Já foi dito que a propaganda de conven- cimento para se juntar a esse grupo ter- rorista é muito mais bem elaborada do que a de qualquer outro grupo com as mesmas finalidades. Contribui decisiva- mente para isso a disposição de recur- sos financeiros abundantes, advindos da
12 O Califa seria o sucessor de Maomé.
co de extremismo político ou religioso a se engajar na guerra, e ainda pelo lado do terror. A resposta, ainda não cabal, está na análise da formação ideológica desses discursos. Pela formação ideoló- gica que vigora, por exemplo, no mundo ocidental, os membros do grupo terro- rista são bárbaros. Por outro lado, nesta nova ideologia de implantar novo cali- fado12, destruir o inimigo e demonstrar força são necessidades primárias. E essa lógica é transformada para conquistar pessoas com a formação ideológica dos ocidentais: a linguagem e as cenas das propagandas, mesmo sendo cruéis, são inspiradas em jogos de computador e em cenas de filmes que são sucesso entre o público-alvo, além de a divulgação ser basicamente pela internet (surfaceweb e deepweb) em vídeos, revistas, jornais e redes sociais.
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Fábio Nogueira de Miranda Filho
Predominantemente, jovens, que sabem falar mais de uma língua, com trânsito livre em vários países, atração pela filo- sofia islâmica radical, estas pessoas nem sempre estão inseridas na sociedade como gostariam de ser. Ao apresentarem problemas financeiros, de relacionamen- to, de falta de perspectiva, ou de crise de identidade e de pertencimento, são também confrontadas com o surgimento do discurso de empoderamento, de nova oportunidade, de simples atenção aos seus anseios. Os recrutadores, ampara- dos por campanhas na internet, remune- rados pelos terroristas, agem para atrair esses jovens para, inicialmente, aperfei- çoarem-se na leitura do Corão e, depois, seguirem cegamente suas leis e ordens.
Mais do que guerra convencional en- tre o mundo e o Daesh, há guerra de ideias. Para combatê-los é preciso ana- lisar seus discursos a partir da formação ideológica do Islã extremista, da mesma forma como eles fazem a propaganda a partir da visão ideológica do Ocidente. Neste ponto, a AD pode ajudar a cons- truir uma formação discursiva, dentro de uma formação ideológica pertinen- te, que seja útil a evitar ou diminuir o número de novos recrutamentos e até recuperar pessoas que já estejam atu- ando a favor deles. Esta formação dis- cursiva traria palavras-chaves e temas na linguagem adequada a eles, e que se contrapõem aos argumentos usados pelo grupo terrorista atualmente.
Considerações finais
O mandatário do país, normalmente o principal cliente do SI, tem, à sua fren- te, o mundo real, este que carrega em si
muitas contradições e incertezas. O ideal seria o domínio do subjetivo pelo obje- tivo. Assim, haveria uma sequência de deduções até se chegar a uma conclusão lógica e única, seja qual for a pessoa que analisa o problema. Contudo, não sendo possível repetir o mundo ideal na reali- dade, tomam-se decisões, e não apenas se chega a conclusões absolutas.
Estas decisões acarretam responsabilida- des e são eivadas de dúvidas. Por isso, é normal que haja reclamações de ambos os lados, decisores e analistas de Inteli- gência, quanto ao processo das decisões tomadas, especialmente aquelas que não surtem o efeito desejado. A lista de quei- xas por parte dos decisores vai desde informações inúteis, não-requeridas e ir- relevantes, até mal redigidas ou inconclu- sivas. Pelo lado dos analistas, há dificul- dades que vão desde não entender o valor analítico das informações produzidas, até o uso do SI para fins pessoais e vazamen- tos de informações classificadas (KISSIN- GER, 2004; NUMERIANO, 2007). De modo geral, os analistas tendem a escre- ver mais sobre conhecimentos, que são verdades já avaliadas, e os decisores pre- ferem notícias, que são verdades a serem avaliadas (SINCLAIR, 1984).
As técnicas de interpretação apresenta- das neste trabalho são formas de minimi- zar os problemas apontados acima. Estas técnicas podem ser mais bem utilizadas pelos analistas de um SI, seja esta utiliza- ção simultânea ou separada, a depender do tipo de texto que será analisado. O quadro 2 a seguir sistematiza as técnicas e sua utilização no SI.
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Ferramenta de interpretação de textos para o uso da inteligência
Quadro 2: Utilização de técnicas de interpretação por analistas de Inteligência
Técnica Subtécnica
Tipo e quantidade de textos objeto de
análise
Resultado esperado
Exemplo de aplicação na Inteligência
Dedutiva
Qualquer tipo e
Demonstrar e verificar conclusões
Evitar desinformação por parte de SI adverso
Inferência análise individual do
Indutiva
texto
Chegar a conclusões
Antecipar a invasão de um país
Avaliação / Mineração de opiniões
Textos de opinião e qualquer quantidade de textos
Atitude do autor quanto aos objetos a que ele se refere
Descobrir tendências da opinião pública sobre determinado evento
Enunciação
Entrevistas orais e qualquer quantidade de textos
Perfil e intenção do entrevistado
Avaliar fonte humana
Expressão
Textos escritos e qualquer quantidade
Perfil do autor
Verificar a autenticidade de um discurso
Análise de Conteúdo (AC)
Relações
de textos
Qualquer tipo de texto e qualquer quantidade de textos
Identificar ideologias
Descobrir reais intenções de um autor
Mineração de dados
Dados estruturados e normatizados em banco de dados
Encontrar padrões
Encontrar padrões de conduta em atos terroristas
Mineração de textos
Qualquer tipo de texto e qualquer quantidade de textos
Sumarizar, extrair informações, categorizar documentos e encontrar padrões
Separar textos por tema, alvo, período de tempo
Análise de discurso (AD)
AD para Inteligência
Textos políticos e em grande quantidade
Caracterizar formações discursivas e ideológicas
Acompanhar negociações de paz
Fonte: elaborado pelo autor
Cumpre salientar que se deve ficar atento ao surgimento de novas teorias e práticas que possam contribuir para a tarefa de interpretação dos analistas de Inteligên- cia. Afinal, o SI deve ser uma organiza- ção de aprendizagem (COOPER, 2005). Para ilustrar a dificuldade do ofício da
Inteligência, relembra-se uma sentença famosa do psicanalista Jacques Lacan (MILLER, 1989), a qual versa sobre as- suntos de psicologia, mas também sobre o percurso impreciso da construção de sentidos: “você pode saber o que disse, mas nunca o que o outro escutou”.

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Fábio Nogueira de Miranda Filho
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COMÉRCIO INTERNACIONAL E INTELIGÊNCIA DE ESTADO:
Identificando ameaças e oportunidades
Leonardo Lins Scuira *
Resumo
Oartigopropõereflexãosobreosagravantesdocomérciointernacionaleasameaças que podemderivardestaatividade,quaissejam:“agroterrorismo”,“guerrascomerciais”, distúrbios econômicos,impactosdastransnacionais,gargaloslogísticos,riscosàsaúdehumana, entre outros.Emparalelo,avalia-setambémasoportunidadesqueoconhecimentoproduzido pela Inteligênciapodegeraraocomércioexteriorbrasileiro.Contudo,paraqueoleitorsesitue no contextointernacionaldenegócios,éapresentadaumabreveintroduçãoàPolítica Comercial Externaeàsuainstitucionalização.Ademais,cadaumadasoportunidadesouameaças analisa- dasnesteestudo,emborajásejamcomumenteabordadaspelacomunidadeinternacional, são fundamentadas,primariamente,nasdiretrizesdaPolíticaNacionaldeInteligência(PNI, 2016).
Relacionando Inteligência à Política
Comercial Externa
Ao pensarmos na política voltada ao
comércio exterior, automaticamente identificamos o Estado como sendo o au- tor e também o operador dessa política. Contudo, o complexo institucional que o país utiliza para se projetar no cenário in- ternacional varia nas suas mais diversas es- pecialidades. De maneira geral, os setores comerciais externos dos países são repre- sentados pelo corpo diplomático. Cumpre
mencionar que, ao tratarmos de Política Comercial Externa (PCE), devemos obser- var o fato de que as empresas nacionais são as usuárias finais dessa política.
Uma das particularidades que alarga a diferença entre a gestão da política co- mercial e a Inteligência de Estado, além dos instrumentos utilizados, é, essen-
cialmente, a forma como as duas ativida- des têm as suas prioridades arranjadas. Enquanto uma deve objetivar, primei- ramente, o aumento do fluxo comercial Internacional envolvendo o Brasil, a ou- tra, por sua vez, precisa analisar as im- plicâncias que este fluxo pode acarretar para os diversos grupos e camadas da sociedade brasileira (BRASIL, 2016).
[...] o conhecimento produzido para prevenir e defender o Estado contra ameaças é
cumulativo, de forma que pode ser reutilizado em momento oportuno.

* Graduando do curso de Comércio Exterior pela Faculdade de Tecnologia do Estado de São Paulo (FATEC).
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Leonardo Lins Scuira
Apesar de os setores de promoção comercial do Ministério das Relações Exteriores (MRE) contarem com a ver- satilidade de corpos diplomáticos com- petentes, estes indivíduos não agem alicerçados nos instrumentos essenciais da Inteligência nacional; logo, não estão qualificados para detectar e avaliar ame- aças à segurança nacional com a mes- ma visão daqueles que atuam guiados por estes instrumentos. Segundo um relatório das Nações Unidas (UNITED NATIONS, 2004, tradução nossa), a “inteligência comercial [trade intelligen- ce] consiste em informações específicas relativas às características das industrias e das diversas empresas”.
Identificando ameaças e oportunidades
As estatísticas indicam, no nível glo- bal, que os países que optam por uma economia aberta ao comércio interna- cional, geralmente, são mais prósperos que aqueles que “fecham” as suas eco- nomias; logo, assume-se que a abertura comercial tende a trazer prosperidade às nações (SMITH, 1812); porém, quan- do a economia de um país é aberta de forma abrupta, também são expostas as fragilidades desta economia às ameaças externas. Observa-se, portando, que a competência da Inteligência nacional na identificação e na avaliação destas ame- aças pode ser estratégica, visto que as análises produzidas pela Agência Brasi- leira de Inteligência (Abin) transcendem a capacidade analítica de outros órgãos. Por conseguinte, o conhecimento produ- zido para prevenir e defender o Estado contra ameaças é cumulativo, de forma que pode ser reutilizado em momento
oportuno. Ademais, lembremos que as ameaças para um dado país, por vezes, podem representar oportunidades para outros. Cabe salientar que, no ambiente internacional de negócios, é muito co- mum que haja essa conjuntura de vanta- gens para uns em detrimento de outros. Isso não significa que, por via de regra, o ente que aufere a vantagem também seja aquele que representa a ameaça.
As ameaças
Para se ter uma ideia do quão suscep- tível às influências externas o país pode estar, não precisamos nem olhar para o exterior, basta observarmos as empresas transnacionais estrangeiras que ope- ram em território nacional. No Brasil, há transnacionais geradoras de receitas que superam, e muito, o Produto Interno Bruto (PIB) individual de vários países. Tais empresas praticam o comércio exte- rior consigo mesmas, mobilizando enor- mes quantidades de bens e serviços en- tre as suas próprias filiais. Digamos que, por alguma razão, uma destas empresas decida encerrar ou reduzir as suas ope- rações no país, seja devido ao aumento do “custo Brasil” ou à perda de compe- titividade para outro país que passou a oferecer melhores vantagens estratégi- cas; o resultado pode ser catastrófico, não só por causa da saída repentina de enormes quantidades de divisa, mas tam- bém pelo colapso de toda a cadeia pro- dutiva dependente das suas operações. Por outro lado, a demasiada facilitação para empresas deste porte pode propi- ciar concorrência desleal com as empre- sas nacionais; ou pior, é possível ainda que o custo excessivamente reduzido
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Comércio internacional e inteligência de estado: identificando ameaças e oportunidades
atraia a prática de dumping
1
prática
as justificativas para a conduta da NSA
esta que pode causar danos irreversíveis a setores produtivos e estratégicos, em especial à indústria. Isso tudo sem se contar os crimes de evasão fiscal, nos quais essas empresas frequentemente se aproveitam de lacunas em acordos internacionais de bitributação.
Quaisquer que sejam as consequências dos atos e decisões das empresas estran- geiras transnacionais, os seus resultados são, invariavelmente, bastante expressi- vos; por causa disso, é importante que as conjunturas macro e microeconômicas do país sejam integralmente monitoradas.
ainda não foram publicamente assumi- das, mas as cogitações sugerem que a agência cultivava outras intenções me- nos amistosas que a nobre garantia da segurança nacional, tais quais: aquisição de propriedade intelectual, infiltração institucional para obter vantagens em acordos comerciais, obtenção de se- gredos industriais para compartilhá-los com empresas americanas, entre outros (MEYER, 2013).
Se, por um lado, tem-se dúvidas quan- to à cumplicidade entre empresas ame- ricanas e a NSA, por outro, quando o mesmo comportamento intrusivo é ob-
Na verdade, o usual é que as multinacionais de muitos países tenham apoio dos serviços de Inteligência, não somente para lhes servir como proteção, mas também para colaborar na identificação de oportunidades estratégicas.
Já que estamos tratando de monitora- mento, cabe mencionar que a Agência Nacional de Segurança dos Estados Uni- dos (NSA), com a cooperação da Inte- ligência americana e britânica, levou o “monitoramento” corporativo para além das fronteiras americanas, espionando transnacionais nos “quatro cantos do mundo”. A questão é que, desde junho de 2013, anos após o analista Edward Snowden “pôr a boca no trombone”,
servado em entidade de Inteligência chi- nesa, não há como negar o fato de que grandes companhias deste país asiático acabam sendo usuárias do conhecimen- to produzido, visto que muitas empresas chinesas de atuação multicontinental são de propriedade mista ou estatal.
No Reino Unido, em junho de 2016, foi aprovada a Lei da Vigilância Digital, dando poder sem precedentes às au- toridades de segurança britânicas para monitorarem tudo a respeito de todos, incluindo as empresas estrangeiras ope- rantes no país – um “prato cheio” para a 6ª Divisão de Inteligência Militar (MI6). Enquanto isso, do outro lado do atlân- tico, os estadunidenses tentam passar uma lei similar no congresso americano. No Brasil, em nível mais regional, trami- ta o Projeto de Lei (PL) nº 5.074/2016, que autoriza o Ministério Público e dele-

1 Dumping é a comercialização de produtos a preços inferiores ao custo de produção, geral- mente com o intuito de eliminar a concorrência local e, por vezes, quando essa meta é atingi- da, passa-se a praticar preços abusivos.
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Leonardo Lins Scuira
gados de polícia a solicitarem, em todo o Brasil, dados cadastrais de qualquer usuário de serviços de comunicação.
A rede de espionagem corporativa tem “transbordado” os limites Estatais e ver- tido sobre as mãos das próprias transna- cionais, haja vista que estas corporações encontram amparo legal na estrutura jurídica de vários Estados, que pratica- mente as permitem espionar, por conta própria, aqueles que a elas se opõem (HENNINGSEN, 2013).
O ordenamento jurídico brasileiro não permite que o órgão central de inteli- gência procure adquirir segredos sensí- veis de transnacionais estrangeiras, seja em solo nacional ou internacional, ainda menos com objetivos que transpassem o simples propósito de preservar a se- gurança nacional; portanto, esta ativida- de, comumente praticada por órgãos de Inteligência estrangeiros, não pode ser reproduzida pela Abin. Não se pode, porém, contestar a importância de se de- senvolver atividades de Contrainteligên- cia para a proteção do interesse das ins- tituições brasileiras, ainda que, de certa forma, este interesse seja projetado para além das fronteiras. Além do mais, não é muito comum de se ver economias de- senvolvidas deixarem as suas empresas se aventurarem mundo afora sem as pro- ver de qualquer mecanismo de proteção e Contrainteligência. Na verdade, o usual é que as multinacionais de muitos países tenham apoio dos serviços de Inteligên- cia, não somente para lhes servir como proteção, mas também para colaborar na identificação de oportunidades estratégi- cas. Trataremos disso mais adiante.
Por falar em Contrainteligência, percebe- -se que ouvimos muito se falar em Con- traterrorismo; mas será que ouvimos se falar em “Contra-agroterrorismo”? Para Chalk (2004, pag. 11, tradução nossa), “agroterrorismo é definido como a intro- dução deliberada de agentes de doença contra a agropecuária, para o propósito de enfraquecer a estabilidade socioeco- nômica e/ou gerar medo”.
O “agroterrorismo”, embora seja con- siderado, em alguns países, como uma forma secundária de agressão, pode ser relevado como ameaça de grande poten- cial às nações que dependem fortemente da economia agrícola, como é o caso do Brasil. Isto posto, devemos nos apegar ao fato de que as extensivas áreas agrárias brasileiras propiciam condições favorá- veis a este tipo de agressão. Para Monke (2007, pag. 5, tradução nossa), “Mesmo que a agricultura não seja a primeira es- colha de um terrorista porque não causa tanto choque quanto os alvos terroristas mais tradicionais, muitos analistas a con- sideram um alvo secundário viável”.
Não é difícil presumir quais seriam os potenciais intentores e beneficiários deste tipo de barbárie. As suas inten- ções e objetivos podem ser os mais va- riados, porém, neste estudo, focaremos nos agravantes econômicos. Nesse con- texto, digamos que indivíduos ou gru- pos pretendessem obter receitas através de “perdas” na produção agropecuária, para tal, bastaria que eles adquirissem os produtos nos mercados futuros de commoditiesantes do pressuposto ata- que e explorassem as flutuações dos preços geradas pela baixa oferta e alta
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Comércio internacional e inteligência de estado: identificando ameaças e oportunidades
demanda2 (CHALK, 2004, pag. 45). que não se remediaria nem os danos já
Surge, então, uma outra questão pre- ocupante para o Brasil: a fragilidade da economia brasileira às oscilações nos preços das commodities, como pude- mos observar neste início de século.
causados, nem os que derivariam destes. Além disso, os recursos disponíveis para a Inteligência não são ilimitados. Neste sentido, seria mais viável direcionar es- forços na produção de conhecimento
[...] na Estratégia Nacional de Defesa (BRASIL, 2008), a única diretriz das medidas de defesa que vagamente se refere à ameaça biológica, ainda não contempla qualquer tipo de prevenção contra ataques biológicos na agropecuária.
Afinal, a Contrainteligência pode de- terminar se há, de fato, a existência do agroterrorismo no Brasil? Uma forma grosseira de tentar descobrir se este já ocorreu, seria através do cruzamento de dados. Por exemplo: pode-se fazer um levantamento das datas e locais das incidências dos surtos repentinos de doenças e cruzar os resultados com as formas e a velocidade em que a doença normalmente se propaga em condições naturais; a partir daí, se os resultados fo- rem suspeitos, compara-se estes dados com aqueles das flutuações dos preços e se, ainda assim, estes coincidirem em discrepâncias muito incomuns, é só fa- zer um levantamento dos beneficiários dos mercados de futuros; com isso, se forem detectados acertos “bons demais pra serem verdade”, tem-se então pos- síveis suspeitos. O problema com isso é
para uso em métodos preventivos.
Ao pensarmos em possíveis autores do agroterrorismo, não podemos des- considerar a elegibilidade dos próprios Estados como suspeitos deste tipo de agressão. Um indício dessa suspeita é observado nas várias acusações de Fi- del Castro contra os Estados Unidos por alegadamente terem despejado pragas e doenças em solo cubano nos tempos de guerra fria (LOCKWOOD, 2009). Com isto, observamos uma tentativa de deses- tabilização de Cuba para fins de combate a uma ideologia: o comunismo, que, di- ga-se de passagem, não é a mais promis- sora para o comércio internacional. Não nos esqueçamos de que a queda deste regime no leste europeu afetou a econo- mia brasileira, uma vez que as enormes quantidades de investimentos, que antes se depositavam no Brasil, foram desvia- das para as economias recém-abertas do leste da Europa (IPEA, 2006).
Para ilustrarmos uma outra situação em que “certos entes” podem se beneficiar de desastres agrários em detrimento de outros, analisemos o caso em que a co- tonicultura no sul do Brasil foi pratica- mente extinta de 1990 e 2001, devido à introdução da praga algodoeira conhe-

2 É muito comum que os próprios produtores agrícolas manipulem os preços das commodities através da redução coletiva de produção e rotatividade de cultura em pequenas porções. Esta estratégia é suficiente para causar flutuações nos preços e otimizar lucros.
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cida como “bicudo”3, que devastou 95% das lavouras e endividou agricultores de forma praticamente irreversível. Os in- seticidas, de origem estrangeira, eram caríssimos e só fizeram com que os co- tonicultores adiassem a falência. Quem lucrou? Sabe-se que a alemã BASF – maior indústria de defensivos agrícolas do mundo – certamente faturou imensas somas com a venda de inseticidas. Os cotonicultores subsidiados do sul dos Estados Unidos também se beneficiaram das flutuações dos preços. É interessante notar que houve uma certa coincidência quando, no ano de 2002, o Brasil levou os Estados Unidos para o painel de solu- ção de controvérsias da OMC; o motivo era o subsídio do governo americano à produção e também à exportação dos cotonicultores estadunidenses. Diante disso, na situação hipotética de ter sido intenção americana atingir a concorrên- cia, a estratégia teria funcionado como um “tiro de misericórdia”. Entretanto, convenhamos que é pouco provável que os Estados Unidos fariam ataques bio- lógicos por meras razões econômicas, mesmo porque é o “Tio Sam” que roda a máquina da principal moeda de troca do mundo; assim, os subsídios são bem mais vantajosos. Lembremos, contudo, que essa supremacia monetária é uma das ra- zões para o resto do mundo se preocupar ainda mais com os subsídios americanos.
Felizmente, os exemplos supracitados são meramente ilustrativos; no entan- to, eles servem para refletirmos sobre a sensibilidade do setor agrário aos riscos
de uma deliberada agressão “agroterro- rista”, pois há demasiada facilidade de se planejar, executar e sair impune des- te tipo de terrorismo. Nesse senso, se pensarmos na quantidade de aviões de pequeno porte que sobrevoam as ex- tensas áreas cultiváveis do oeste brasi- leiro – sem que haja conhecimento da nacionalidade e histórico dos tripulantes e, muitos deles, sem ao menos terem planos de voo –, automaticamente assu- miremos que isso tudo já pode até estar sendo debatido nas mesas de Contrain- teligência nacional. Em contraste com isso, o ingresso da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) na composição do Sisbin, em junho de 2016, mostra que esta agência provavelmente comporia a mesa em um possível debate sobre o tó- pico, juntamente com a Abin e a Força Aérea, é claro.
Cumpre apontar que, na Estratégia Na- cional de Defesa (BRASIL, 2008), a úni- ca diretriz das medidas de defesa que vagamente se refere à ameaça biológica, ainda não contempla qualquer tipo de prevenção contra ataques biológicos na agropecuária. Mas percebe-se que é ci- tado o Gabinete de Segurança Institucio- nal (GSI-PR) como sendo um dos órgãos responsáveis pelo provimento.
Todas as instâncias do Estado deverão contribuir para o incremento do nível de Segurança Nacional, com particular ênfase sobre: [...] as medidas de defesa química, bacteriológica e nuclear, a cargo da Casa Civil da Presidência da Repú- blica, dos Ministérios da Defesa, [...] e do GSI-PR, para as ações de proteção à
3 O bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) é um inseto de ciclo reprodutivo extremamente rápido e numeroso. O seu controle é feito através de baterias diárias de inseticidas de custo muito elevado. O desgaste do equipamento de aplicação também é muito alto.
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população e às instalações em território nacional, decorrentes de possíveis efei- tos do emprego de armas dessa natureza (Brasil, 2008, p. 4, grifo nosso).
Desde a época do mercantilismo, os Es- tados têm utilizado o comércio exterior como fator determinante de influência internacional. Percebe-se que, em pleno século XXI, a estratégia continua a mes- ma. Quando o comportamento de um país desagrada a comunidade internacio- nal, a primeira forma de resposta desta é impor sanções comerciais naquele, pois essa estratégia funciona, tanto para pu- nir, quanto para prevenir, uma vez que ela pode causar distúrbios em setores sensíveis da economia e forçar o país a mudar o seu comportamento. Os embar- gos econômicos podem, a curto prazo, retirar do Estado a capacidade de apro- visionamentos essenciais à economia nacional, tais como: energia, bens pri- mários, segurança alimentar, etc. Estas medidas, por vezes impopulares, cau- sam sérios prejuízos à sociedade e nem sempre resultam na desestabilização dos seus governos.
As retaliações comerciais são, muitas vezes, oriundas de conflitos políticos; no entanto, elas também podem culmi- nar neles. (ZENG, 2004). Não aquém dos conflitos ideológicos, nota-se que os conflitos que envolvem o comercio internacional, ao longo da história, têm gerado profundas turbulências políticas e conduzido Estados às instâncias mais hostis das projeções externas: a interven- ção militar e o conflito armado.
A anexação da Criméia pela Rússia, em 2014, resultou em severas sanções co- merciais dos Estados Unidos e da União Europeia contra este populoso país da Eurásia, aumentando ainda mais as ten- sões geopolíticas no Leste Europeu. As sanções contra a Rússia, por outro lado, acabaram por favorecer os pecuaristas brasileiros – responsáveis pelo 2º maior volume de exportação de carne bovina do mundo –, que se beneficiaram da de- manda russa pela carne sul-americana.
Sabe-se que o país deve estar preparado para as oscilações repentinas no ritmo de comércio, pois entende-se que estas oscilações são movidas
por fatores variáveis, tais como: tendências, preços, acordos, políticas, natureza, entre outros.
Um dos casos mais conhecidos de dis- puta comercial envolvendo o Brasil no âmbito da Organização Mundial do Co- mércio (OMC), foi contra o Canadá, en- tre a canadense Bombardier e a brasileira Embraer4. A dita “guerra comercial” se estendeu para além da aviação, quando o Governo canadense decidiu suspen- der a compra da carne bovina brasileira, alegando temer o risco de que a carne poderia estar contaminada com o “mal da vaca louca”. Mesmo após ser confir- mada a falsidade das alegações, a notícia se espalhou para o mundo todo, sendo veiculada em rodadas de negócios como

4 Caso em que, numa disputa por licitação, em 1999, o Canadá acusou o Brasil de subsidiar a Embraer na produção de aviões. O Brasil revidou com a mesma acusação contra os ca- nadenses, mas resultou no direito de o Canadá retaliar o brasil em US$ 233 milhões anuais, por 6 anos.
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uma espécie de propaganda adversa à reconhecida qualidade da carne brasi- leira. Cumpre mencionar que, em março de 2016, mais de uma década depois dessa “guerra”, cerca de cem represen- tantes dos dois países se encontraram no parque tecnológico de São José dos Campos – SP para discutirem acordos de cooperação aeroespacial, envolven- do empresas brasileiras e canadenses. Segundo o Cônsul Geral do Canadá, Emond, em declaração à imprensa (SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, 2016), “apesar dos acordos serem sigilosos, eles serão muito proveitosos para os dois lados”. Diante dos crescentes avanços do Bra- sil na atuação aeronáutica, o ingresso da Anac no Sisbin, mais uma vez, mostra-se importante para integrar a Inteligência ao que acontece no setor aeroespacial.
Quanto aos pecuaristas brasileiros, per- cebe-se que já experimentaram grandes influências externas de cunho comercial em situações totalmente distintas: numa hora, envolvendo diretamente o Brasil, em outra, o país não tinha qualquer coi- sa a ver com o conflito. Nesse contex- to, conscientes dos efeitos duradouros dessas influências e objetivando prever os efeitos de longo prazo, se quiserem, os analistas do Ministério da Agricultu- ra podem até fazer alguns cruzamentos estatísticos de dados produzidos pelos observatórios da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) do GSI-PR, haja vista que, no que tange às projeções futuras, o referido órgão possui estudos úteis para o monitoramento da dinâmica agro- pecuária. No entanto, aos olhos dos pro- fissionais de Inteligência, a antecipação dos fatos não pode depender de estudos
posteriores aos acontecimentos, pois es- tas ocorrências devem ser prevenidas, e não meramente observadas.
Não é novidade alguma que vivemos em uma era de “divulgação digital”; com isso, a imagem dos entes públicos e pri- vados trafega no cenário internacional em velocidade praticamente imediata. E, ao mesmo tempo em que uma informa- ção positiva está sendo veiculada na mí- dia, uma informação negativa pode estar neutralizando os efeitos positivos. Com- preende-se, portanto, que a questão da “saúde humana” é determinante para a ruptura do comércio internacional, pois este é um assunto tipicamente midiáti- co; logo, assume-se que o tema pode ser usado deliberadamente como ferramen- ta de propaganda adversa, que, por sua vez, concerne à atividade de Inteligência.
Sabe-se que o país deve estar preparado para as oscilações repentinas no ritmo de comércio, pois entende-se que estas oscilações são movidas por fatores variá- veis, tais como: tendências, preços, acor- dos, políticas, natureza, entre outros. Assim sendo, não podemos permitir que a falta de planejamento e uso de fiscali- zações inadequadas agravem os gargalos logísticos e aumentem o “custo Brasil”. A garantia da segurança da sociedade brasileira é essencial, mas o comércio ex- terior, em contraste, é fundamental para o fomento da economia; por isso, é pre- ciso agilizá-lo, e não o obstruir.
Com vista a reduzir o tempo e os cus- tos no comércio internacional, os países vêm criando mecanismos que simplificam os procedimentos aduaneiros e fazem o transporte ficar mais rápido e mais efi-
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ciente. Na seara comercial, o Brasil tem demonstrado interesse em se enquadrar nos padrões internacionais de qualidade, confiança e agilidade. Como prova disso, a Secretaria da Receita Federal do Bra- sil (SRFB) está emitindo a certificação de Operador Econômico Autorizado (OEA), a qual dá às empresas ostatusde empre- sa confiável e segura; por conseguinte, estas passam por menos fiscalização, menos esperas para liberações em alfân- degas e ainda têm preferência nas filas. Obviamente, isso traz diversas vantagens para o país, pois as autoridades podem focar os seus esforços naquelas empre- sas menos idôneas, ou seja, naquelas que não possuem a certificação OEA. O risco no uso deste instrumento é eviden- te: deve-se depositar plena confiança nos atores da iniciativa privada. Até aí tudo bem, mas o que torna este mecanismo um pouco mais complexo é o fato de ele precisar ser reconhecido internacional- mente para ter efeito no trajeto inteiro da operação, ou seja, aceito em ambos os países, do importador e do exportador. Para isso, existe uma outra ferramenta chamada Acordo de Reconhecimento Mútuo (ARM), na qual os países reco- nhecem entre si as empresas portadoras da certificação OEA. Com esta “carta branca” de tráfego de bens, estamos tratando de cargas partindo do berço de produção do país exportador, atravessan- do fronteiras alheias em distâncias pla- nisféricas e chegando até o consumidor final no país importador. A questão é que esse trajeto todo é percorrido com pou- quíssimos monitoramento e fiscalização. Nessas circunstâncias, por hora, deixare- mos de lado a listagem dos riscos que esses mecanismos podem representar quando vistos sob a ótica da Inteligência.
As oportunidades
No mundo dos negócios internacionais, é frequente que as melhores oportunida- des sejam identificadas nas necessidades que afloram de situações inesperadas, quais sejam: instabilidade política ou social, acontecimentos naturais, tendên- cias de mercado, lei de oferta e deman- da, entre outras. No entanto, é comum que essas situações, as quais poderiam até ser previstas, sejam menosprezadas devido ao baixo potencial imediato que elas representam. Além disso, qualquer previsão que ainda não tenha se consu- mado, possui, mesmo que minimamente, um certo caráter especulativo.
Sobre a “era digital”, é possível que en- contremos formas de usar as más notí- cias (veiculadas na mídia, sobretudo na internet) a favor daqueles que são pre- judicados por elas, ou, pelo menos, for- mas de atenuar os danos causados. Uma das formas de se fazer isso, é através de uma ferramenta chamada Otimização de Mecanismos de Busca (no original inglês, searchengineoptimization, SEO), com a qual é possível manipular websites
,
através de palavras-chaves, para que apareçam nas primeiras linhas das bus- cas orgânicas – não-pagas – de meca- nismos de procura, como Google, Bing, etc. Não esqueçamos que esta colocação no rankingdos resultados também pode ocorrer naturalmente, com a intensa busca e acesso a estes websites
.
Vista a forma como estes mecanismos funcionam, imaginemos a provável si- tuação em que uma pessoa estrangei- ra esteja curiosa para saber um pouco mais sobre o vírus “Zica“; basta que
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digite na busca a palavra “Zica”. Até aí tudo bem, mas o problema é que, junto com essa “palavrinha”, também aparecerá a palavra “Brasil” e um mon- te de coisas apocalípticas denegrindo a imagem do país. Assumindo-se que não há forma alguma de desassociar esta doença à imagem do Brasil, alter- nativamente, pode-se fazer uso dessa mesma palavra para otimizar websites de interesse estratégico para o país, como aqueles de estímulo ao investi- mento no Brasil, sitesde promoção de exportação, turismo e outros tantos. É possível até “reunir” resultados de pesquisas que indicam que a doença já está controlada e que os preços dos produtos brasileiros estão agora muito competitivos por causa da baixa de- manda; ou seja, encontrar algo favorá- vel naquilo que é inevitável. Isso é só um exemplo corriqueiro; na verdade, há uma infinidade de oportunidades para o uso deste tipo de ferramenta; elas são úteis até mesmo para mitigar efeitos da propaganda adversa.
Uma outra questão aparente, em termos de perspectiva mais futura, é observada na crescente dependência de energia e proteína que a China enfrenta. Essa de- manda do “gigante asiático” faz os chi- neses projetarem os olhos para a Costa Pacífica da América Latina para acesso à produção brasileira. Para isso, os chi- neses se dispõem a investir enormes quantidades de capital na infraestrutura logística desta rota. Essa aproximação não precisa ser vista como uma tentativa de domínio ou de fazer do Brasil uma “matriz energética”, ela pode simples- mente ser visualizada a favor do Brasil,
que pode se beneficiar de uma nova rota com fluxo ativo para o mercado asiáti- co, pois, apesar das tensões no mar do sul da China trazerem incertezas (WIE- GAND, 2011), nem os chineses nem os norte-americanos pretendem diminuir o ritmo comercial de mais de US$ 5 tri- lhões anuais nessa região oceânica. Para o Brasil, é extremamente estratégico que o oeste brasileiro tenha acesso a esta re- gião através dos corredores bioceânicos, inclusive para o possível fornecimento de material bélico em caso infortunoso de conflito armado, que é possível, visto que as tensões tendem a se acentuar no Pacífico. Nesse contexto, é natural que os Estados queiram se armar “até os dentes”, e é natural que o Brasil queira fomentar a indústria bélica nacional atra- vés da exportação de armamentos.
Ao se avaliar as ameaças (se estas de fato existem) apresentadas anteriormente neste estudo, podemos reparar que elas representam perdas para uns ao mesmo tempo que geram potencial de ganhos para outros. Ao pormos os serviços de Inteligência na posição de defesa contra estas ameaças, percebemos que há po- tencial de tornar o conhecimento, que foi originalmente produzido para defesa, favorável ao interesse do Estado e tam- bém da inciativa privada nacional.
Entende-se, com isso, que as oportu- nidades podem ser esporádicas e de rápido retorno assim como podem ser gradativas e trazer retornos de médio e longo prazos. Justamente por isso, a previsão de duração do curso dos even- tos deve ser a mais acurada possível. O surgimento de momentos oportunos
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é um processo cíclico; por isso, é ne- cessário que se tenha uma cultura de “oportunismo comercial” cultivada nos órgãos de Inteligência.
Conclui-se
Ao observarmos minuciosamente cada tópico mencionado nesse estudo, per- cebemos que é virtualmente impossível
[...] esta é a oportunidade para profissionais, pesquisadores e especialistas em Inteligência brasileiros ressoarem suas vozes com mais vigor nos cenários nacional e internacional [...]”.
Sabemos que a neutralidade e a proje- ção internacional singela estão “estam- pados no cartão postal do Brasil” (BRA- SIL, 2008). Mas também sabemos que a nova conjuntura do comércio internacio- nal tem forçado muitos países a “muda- rem os seus posicionamentos” no globo. Portanto, a procura pelo dado negado não tem de ser necessariamente limitada às nossas fronteiras. Assumindo-se que a posse desse tipo de informação pode favorecer o posicionamento do Brasil no cenário internacional e contanto que o processo de procura por dados não fira os princípios constitucionais brasileiros nem viole os tratados internacionais assi- nados, pergunta-se: por que não?
se preservar a integridade da segurança nacional e o bem-estar da sociedade sem que o comércio exterior seja conduzido de maneira transversal dentro da Políti- ca Nacional de Inteligência; portanto, é preciso que essa cultura comercial inte- gre a construção da literatura nacional de Inteligência (MARTINS, 2015).
Observamos, também, que se faz neces- sário o investimento em capital humano, com pessoal capacitado para integrar a Inteligência nacional ao comércio ex- terior brasileiro. Nesse sentido, é im- prescindível que os profissionais de In- teligência tenham acesso a recursos de qualidade e tenham aproximação direta com os acadêmicos e profissionais do comércio exterior de bens e serviços e também do mercado financeiro. Para Martins (2015, pag. 18) “Este é o tem- po; esta é a oportunidade para profissio- nais, pesquisadores e especialistas em Inteligência brasileiros ressoarem suas vozes com mais vigor nos cenários na- cional e internacional [...]”.

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O SISTEMA DE INTELIGÊNCIA PENITENCIÁRIA E A
ANÁLISE E O MONITORAMENTO DE ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS ATUANTES EM SANTA CATARINA
Rosane Fioravante *
Antônio Marcos Feliciano **
Resumo
Otrabalhodeanáliseemonitoramentodasorganizaçõescriminosas-noSistemaPrisional de SantaCatarinapassouaserrealizadodeformapermanenteesistemáticaemmeadosde 2010, sendoassumidoefetivamentedesdeabrilde2011,quandoocorreareformaadministrativa em SantaCatarinaqueculminacomacriaçãodaDiretoriadeInteligênciaeInformação(DINF) da SecretariadeEstadodaJustiçaeCidadania(SJC),aqualpassaacontarcomaAtividadede Inteli- gênciaPenitenciária.Esteórgão,empoucomaisdecincoanosdeatividade,temsido considera- dofundamentalparaomapeamentodasliderançasedasaçõesrelacionadasàsorganizações cri- minosasnoEstado,destacando-seaorganizaçãocriminosaPrimeiroGrupoCatarinense (PGC), quesetornounotóriadevidoaduasgrandesondasdeatentadosocorridasnofinalde2012 e iníciode2013.Esteestudoapontaaorigemdessaorganizaçãocriminosaeasuatrajetória, elen- candoosprincipaisfatoresquecontribuíramparaoseucrescimentoe,emparalelo, apresenta oprocessodeimplantaçãodoórgãodeInteligênciaPenitenciáriadeSantaCatarina, concluindo quesereconheçanaInteligênciaPenitenciária,alémdeumrelevanteinstrumentoparaa seguran- çapública,tambémumeloentreatemáticaOrganizaçãoCriminosaxSegurança Pública.
Organizações Criminosas e a Atividade
de Inteligência
Oacompanhamento sistemático das organizações criminosas atuantes
no Estado de Santa Catarina é conside-
rado de interesse tanto para o Sistema Prisional quanto para as demais insti- tuições de Segurança Pública e para o
* Pós-graduada em Gestão em Segurança Pública (FACVEST). Bacharel em Biblioteconomia (UFSC). Agente de Inteligência Integrante da Diretoria de Inteligência e Informação (DINF/ SJC/SC). Professora na Academia de Justiça e Cidadania nas disciplinas de Inteligência Pe- nitenciária, Ciclo de Produção do Conhecimento (CPC), Doutrina de Inteligência e Organiza- ções Criminosas atuantes em Santa Catarina.

** Doutor em Engenharia e Gestão do Conhecimento (PPGEGC/UFSC). Mestre em Engenharia e Gestão do Conhecimento (PPGEGC/UFSC). Graduado em Ciências Sociais pela Univer- sidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pesquisador na área de Inovação, Gestão do Conhecimento Organizacional, Gestão de Pessoas, Comportamento Organizacional, Empre- endedorismo, Gestão Pública. Membro do Grupo de Pesquisa Inovação em Ciência e Tecno- logia – CNPQ/UFSC. Colaborador da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural da Santa Catarina (EPAGRI). Professor de Pós-Graduação do Centro Universitário FACVEST.
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Rosane Fioravante e Antônio Marcos Feliciano
próprio Governo Estadual. Esse acompa- nhamento se torna mais bem percebido em situações de crise, como as ondas de atentados que assolaram Santa Catarina de 11 a 20 de novembro de 2012, e de 31 de janeiro a 24 de fevereiro de 2013, quando a parceria entre diversas institui- ções buscou efeitos cumulativos de as- sessoramento ao Governo do Estado.
Naquela ocasião, muito se falou sobre crime organizado e Inteligência de Se- gurança Pública, o que possibilitou, a partir dessa perspectiva, delimitar o ob- jetivo do presente artigo, que consiste em apresentar o processo de implan- tação do Sistema de Inteligência Peni- tenciária do Estado de Santa Catarina e o seu papel no acompanhamento das organizações criminosas atuantes no es- tado, pois a obtenção de diagnósticos e prognósticos sobre a evolução de situ- ações relacionadas ao tema consiste no diferencial para o processo decisório no âmbito da Secretaria de Estado da Jus- tiça e Cidadania de Santa Catarina (SJC/ SC), que tem na Atividade de Inteligên- cia Penitenciária um elemento impres- cindível para a instituição como auxílio aos Órgãos de Segurança Pública.
Para este artigo atingir aquele objetivo, foram pesquisados, na literatura, os se- guintes aspectos conceituais: crime orga- nizado, Atividade de Inteligência, Inteli- gência Penitenciária e Segurança Pública. Foram analisadas também notícias dos principais veículos de comunicação im- pressa de Santa Catarina e de outros estados, notadamente jornais de gran- de circulação. Também foram realizadas pesquisa documental, com a devida au-
torização, na Diretoria de Inteligência e Informação (DINF), e entrevista com um dos representantes da instituição.
Inteligência Penitenciária de Santa Cata- rina: Aspectos Históricos
A Atividade de Inteligência no âmbito da Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania de Santa Catarina (SJC/SC) possui uma trajetória ainda curta se considerada a sua criação, ocorrida no ano de 2011, no bojo de um projeto de Reforma Administrativa do Estado, no qual se desvinculou a então Secretaria Executiva de Justiça e Cidadania (SEJC) da Secretaria de Segurança Pública de Defesa do Cidadão (SSPDC). Nesse processo, nasceu a Diretoria de Inteli- gência e Informação (DINF).
[...] a Atividade de Inteligência
possui, nos seus princípios, as proposições diretoras, as bases, os fundamentos e os alicerces que orientam e definem os caminhos da atividade, entre os quais se destaca o Princípio da Oportunidade, o qual orienta que a produção do conhecimento seja realizada em prazo que permita o seu aproveitamento.
Considera-se o embrião da DINF o Núcleo Central de Inteligência (NUCI), criado por meio da Portaria n° 660/ SEJC/2010, o qual foi responsável pelos primeiros trabalhos voltados a quantificar e qualificar integrantes de
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O sistema de inteligência penitenciária e a análise e o monitoramento de organizações criminosas atuantes em Santa Catarina
facções criminosas dentro do Sistema Prisional catarinense.
A Atividade de Inteligência no âmbito da SJC ficou mais solidificada com a pu- blicação da Doutrina Nacional de Inteli- gência Penitenciária (DNIPEN), em abril de 2013. A partir dessa publicação, foi editada a Portaria nº 0322/GAB/DINF/ SJC, de 13 de junho de 2014, que ins- titui o Sistema de Inteligência Peniten- ciária e Socioeducativa (SIPS), e define, no seu Art. 1°, Atividade de Inteligência Penitenciaria como:
“o exercício permanente e sistemático de ações especializadas para identificação, acompanhamento e avaliação de ameaças reais ou potenciais na esfera do Sistema Penitenciário, bem como para prevenir, obstruir, detectar e neutralizar ações adversas, de qualquer natureza, e aten- tatórias à ordem pública, a proteção das instituições e seus integrantes.” (SANTA
CATARINA, Portaria 0322, 2014)
Toda a Atividade de Inteligência é ba- seada no que se denomina “Inteligên- cia de Estado”, considerada, na fala de Gonçalves (2009, p. 40), como acepção clássica. Segundo o autor, “A percepção clássicadaatividadedeinteligência está muitovinculadaàinteligênciade Estado. [...],tendoporescopoasegurança do Estadoedasociedade,eque constituem subsídiosaoprocessodecisórioda mais altaesferadegoverno .”

Neste sentido, é a partir da doutrina clássica que as instituições estabele- cem as suas doutrinas de acordo com as suas especificidades, como ocor- rem, por exemplo, com as instituições de Segurança Pública que, por meio da Doutrina Nacional de Inteligência de
Segurança Pública (DNISP/MJ, 2009), definem as suas finalidades e caracterís- ticas, assim exemplificadas:
a) assessoria, que a qualifica como um órgão de assessoramento, produzindo conhecimentos para o processo decisório e para auxiliar a atividade-fim;
b) produção de conhecimento: que a qualifica como uma atividade de Inteli- gência, na medida em que obtêm dados e, por meio de metodologia específica, transforma-os em conhecimento, para que os órgãos do Sistema Penitenciário, segurança pública e outros possam tomar decisões; e
c) verdade com significado: que a torna uma produtora de conhecimentos preci- sos, claros e imparciais, de tal modo que consiga expressar as intenções, óbvias ou subentendidas, das pessoas envolvidas ou mesmo as possíveis ou prováveis con- sequências dos fatos relatados. (DNISP/ MJ, 2009)
Além das suas finalidades, a Atividade de Inteligência possui, nos seus princípios, as proposições diretoras, as bases, os fundamentos e os alicerces que orientam e definem os caminhos da atividade, entre os quais se destaca o Princípio da Opor- tunidade, o qual orienta que a produção do conhecimento seja realizada em prazo que permita o seu aproveitamento.
Neste sentido, no que se refere às facções criminosas, tem-se, nos preceitos doutri- nários, o suporte norteador para que, de forma permanente e sistemática, sejam realizados a análise, o mapeamento das suas ações ou reações e o monitoramen- to das suas lideranças que se encontram recolhidas nas unidades prisionais, de onde comandam ações em nome das fac- ções, o que se considera vulnerabilidade
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em cada sistema prisional, para o estado e para a segurança pública.
Dessa forma, a DINF busca, por meio do uso da informação, derivada da ação de Inteligência, criar condições favorá- veis à tomada de decisão no âmbito da SJC – promovendo diagnósticos e prog- nósticos–, subsidiando, assim, o plane- jamento estratégico da instituição a que pertence e, ainda, contribuindo para as forças de segurança do estado.
Sob esse ponto de vista e entendendo o Sistema Prisional como um “celeiro” de informações relacionadas às organiza- ções criminosas, o desafio é diário para o Departamento de Administração Pri- sional (Deap), órgão responsável pela custódia legal do preso no Estado de Santa Catarina.
Cabe ao Deap proporcionar, ao mesmo tempo, as condições necessárias para a ressocialização do indivíduo, conforme preconiza a Lei de Execuções Penais (LEP), no seu Art. 1° “Aexecução pe- naltemporobjetivoefetivaras disposi- çõesdesentençaoudecisãocriminal e proporcionarcondiçõesparaa harmôni- caintegraçãosocialdocondenadoe do internado ”.
Contudo, ainda que muito se tenha avançado, o crime organizado ainda tem demonstrado proporcionar um “atrativo” maior ao indivíduo que ingressa no Sis- tema Prisional, apesar de muitos desses indivíduos já terem passado pelo Sistema Socioeducativo. Além de serem oriun- dos de famílias de poucas estruturas fi- nanceiras e valores éticos ou terem o seu histórico de vida em comunidades onde
o tráfico de drogas predomina, os “be- nefícios” ofertados por facções crimino- sas se tornam mais convidativos do que os oferecidos pelo Estado.
As organizações criminosas constituem uma ameaça à ordem pública; portanto, é
dever do Estado agir para reduzir ou eliminar os impactos das suas ações. Dessa forma, o uso da informação passou a ser percebido como estratégico para o combate aos crimes praticados por essas organizações.
Assim como o principal elemento norte- ador que rege a atividade de inteligência é a Doutrina de Inteligência Penitenciá- ria, é importante ter definida a identida- de institucional e, neste sentido, a DINF , logo no início da sua criação, estabelece a sua essência, definindo como missão: “Colherdadoseinformaçõesdos Siste- masPrisionaleSocioeducativo, necessá- riosàproduçãodoconhecimento, para serviremdeparâmetrosnasdecisões do titulardapastadaSecretariada Justiça eCidadania”. E, considerando-se os re- flexos extramuros, característica inerente a esses dois sistemas (prisional e socio- educativo), a DINF contribui consubs- tancialmente com as demais instituições de Segurança Pública, tendo por visão: “Desenvolverumarededeparcerias nos SistemasdeInteligênciaEstadual, Nacio- naleInternacional,destinadaatroca de informações,dadoseconhecimento ”.
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O sistema de inteligência penitenciária e a análise e o monitoramento de organizações criminosas atuantes em Santa Catarina
A rede de parcerias prevista na visão da DINF é considerada primordial principal- mente em situações de crise no estado, como as ondas de violência instauradas pelo “poder paralelo” do crime organi- zado, a exemplo das duas primeiras on- das de ataques ocorridas de novembro de 2012 a janeiro de 2013, que deixa- ram a população em pânico, e cujo re- sultado foi a transferência de 40 presos considerados responsáveis pelos ataques ao estado de penitenciárias de seis cida- des de SC para o Sistema Penitenciário Federal.
A Organização Criminosa de Santa Cata- rina com Maior Representatividade e as suas Ações
As organizações criminosas constituem uma ameaça à ordem pública; portan- to, é dever do Estado agir para reduzir ou eliminar os impactos das suas ações. Dessa forma, o uso da informação pas- sou a ser percebido como estratégico para o combate aos crimes praticados por essas organizações.
As autoras Genena e Cruz (2014) apon- tam que:
É notório que as facções criminosas não podem continuar logrando êxito em seus
desígnios e por este motivo o Estado precisa de meios capazes de garantir a segurança pública, combatendo de forma eficaz as organizações criminosas que impõem temor à sociedade, seja pela edição de legislação própria para o com- bate deste tipo de crime, seja pelo in- vestimento nas atividades de Inteligência para subsidiar suas decisões. (GENENA; CRUZ, 2014).

Antes de discorrer sobre os aspectos relacionados à Atividade de Inteligência
como instrumento para subsidiar o pro- cesso decisório, faz-se necessário con- ceituar Organizações Criminosas. Para Mingardi (2007):
[...] não é a modalidade do crime que identifica a existência de Crime Orga- nizado. O que o define são algumas características que o tornam diferente do crime comum. Essas características, para a maioria dos autores, são cinco: Hierarquia, Previsão de lucros, Divisão do trabalho, Planejamento empresarial, e Simbiose com o Estado. (MINGARDI, 2007, p. 57).
É por esse prisma que, já em 1998, Min- gardi definiu organização criminosa da seguinte forma:
Grupo de pessoas voltadas para ativida- des ilícitas e clandestinas que possui uma hierarquia própria capaz de planejamento empresarial, que compreende a divisão de trabalho e o planejamento de lucros. Suas atividades se baseiam no uso da violência e da intimidação, tendo como fonte de lucros a venda de mercadorias ou serviços ilícitos, no que é protegido por setores do Estado. Tem como ca- racterísticas distintas de qualquer outro grupo criminoso um sistema de clientela, a imposição da lei do silêncio aos mem- bros ou pessoas próximas e o controle pela força de determinada porção de ter- ritório. (MINGARDI, 1998, p. 82 e 83). (Grifo nosso)
Na legislação brasileira, o Decreto nº 5.015/2004, que promulgou a Conven- ção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), a partir da necessidade da união entre países para combater a prá- tica do crime organizado internacional, definiu “Grupo criminoso organizado”:
Grupo estruturado de três ou mais pes- soas, existente há algum tempo e atuan- do concertadamente com o propósito de
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cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indireta- mente, um benefício econômico ou outro benefício material. (BRASIL, Decreto nº 5.015, 12 de março de 2004).
Somente em agosto de 2013, por meio do Art. 1º § 1º da Lei nº 12.850, foi definido como Organização Criminosa:
[...] associação de 04 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e ca- racterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de ob- ter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas se- jam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. (BRASIL, Lei nº 12.850, 5 de agosto de 2013).
No que se refere à origem das organiza- ções criminosas, Mingardi (2007, p. 57) aponta que “Nonossopaís,acadeiaé a grandegestoradessasorganizações. Foi nelaquesurgiramoComando Vermelho (CV), oPrimeiro Comandoda Capital (PCC)eoTerceiroComando(TC) ”.
O estado catarinense não difere dessa realidade, pois a organização crimino- sa Primeiro Grupo Catarinense (PGC) apresentou os seus primeiros embriões em 2001 e tem declarada a sua data de fundação em 3 de março de 2003, na Ala de Segurança de Extensão da Peni- tenciária de Florianópolis. Os objetivos do grupo naquela ocasião eram voltados à obtenção de recursos financeiros, prin- cipalmente para o pagamento de advo- gados, autodefesa, hierarquia, status de poder na vida do crime, à defesa de uma “bandeira” contra a opressão do Estado, passando a arrebatar adeptos, lutar por direitos na Constituição vigente e impor
as suas próprias “leis”, fazendo uma apologia ao “crime 100% correto” como justificativa pelos crimes praticado.
Em maio do mesmo ano (2003), foi inaugurado o Complexo Penitenciário do Estado (COPE), em São Pedro de Alcân- tara, inicialmente com uma penitenciária, que é conhecida como Penitenciária de São Pedro de Alcântara e que passou a ser a maior unidade prisional catari- nense. Para essa unidade prisional, fo- ram transferidos os fundadores do PGC juntamente com outros considerados os mais perigosos do estado. De acordo com Vargas e Pereira (2013), essa uni- dade prisional foi inaugurada sem ter as condições mínimas de funcionamento: com apenas cinco agentes penitenciá- rios, sem fornecimento de água e sem os itens básicos de higiene aos inter- nos. Essa situação deu razões para que os internos ficassem revoltados, sendo comum, naquela época, o uso da força para conter a massa carcerária, sendo que essa “situação serviu para embasar o discurso do PGC”, que era pautado no “crime 100% correto”.
Um fator determinante para a dissemi- nação das ideologias do PGC dentro das Unidades Prisionais (UP) do estado foi a alteração da Lei n° 11.464, de 28 de março de 2007, que dispõe sobre crime hediondo e que repentinamente conce- deu benefício de progressão de regime para mais de ¼ da massa carcerária que cumpria pena em regime fechado. Consi- derando-se que o país não estava prepa- rado em número de UP compatíveis ao regime semiaberto, tornou-se comum, em Santa Catarina, a permuta dos presos
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O sistema de inteligência penitenciária e a análise e o monitoramento de organizações criminosas atuantes em Santa Catarina
que passavam para o regime semiaberto da Penitenciária de São Pedro de Alcân- tara com presos do regime fechado das demais cidades de SC.
Em 2007, ocorreu uma série de homi- cídios na Penitenciária de São Pedro de Alcântara, os quais teriam sido motiva- dos por rivalidades e demonstração de poder da facção PGC, e estimularam o estado a responder com a transferência de treze presos para o Sistema Peniten- ciário Federal (SPF).
Este foi considerado outro fator respon- sável pelo fortalecimento do PGC, em razão da estada e convivência por dois anos com as maiores lideranças crimino- sas do Brasil, e, em 2009, doze deles voltaram ao Sistema Prisional Catarinen- se, trazendo consigo uma visão diferente do “crime correto” e também uma pro- posta de parceria com a organização cri- minosa Comando Vermelho (CV), oriun- da do Rio de Janeiro. Esses elementos difundiram dentro do Sistema Prisional Catarinense e fora dele, a ideologia, me- todologia e logística aplicadas nos gran- des centros urbanos, como Rio de Ja- neiro e São Paulo, considerando-se que voltaram ao estado com mais “bagagem” e conhecimento do crime organizado na- cional e até mesmo internacional.

Em 2010, Florianópolis e o município vizinho, São José, são assolados pela maior onda de assaltos já ocorrida na re- gião, sendo comuns cartas e estatutos do PGC serem apreendidas junto ao mate- rial resultante de roubos e furtos. Os ob- jetivos descritos nessas cartas e estatutos já apontavam para um desdobramento do PGC original, pois acrescentaram
promover ações contra os servidores da segurança pública, do Ministério Público e do Judiciário, manter controle das “bo- cas” do tráfico de drogas, manter “con- sórcio” em que uma facção empresta ar- mamento ou mão-de-obra para a outra e transporte de esposas e familiares para visitas aos presídios.
Nesse período, o estado, por meio da Secretaria de Segurança Pública (SSP), ainda não reconhecia a existência do PGC, mas apurou que as ordens te- riam origem nas UPs e, mais uma vez, a alternativa adotada foi a transferência para o SPF. Assim, onze presos foram transferidos para a Penitenciária Federal de Campo Grande/MS, em 20 de no- vembro daquele ano, conforme noticiou SANTOS (2010):
Os internos foram transferidos de peni- tenciárias catarinenses para o Presídio Fe- deral de Campo Grande a pedido da Se- cretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão de Santa Catarina. O objetivo é conter a sequência de assaltos praticados na Grande Florianópolis, co- mandada por pessoas que cumprem pena nas unidades. (SANTOS, 2010).
Com o retorno, após dois anos de con- vívio no SPF, os presos transferidos passaram a ser considerados de maior respeitabilidade perante a massa carce- rária catarinense, além de se tornarem extremamente mais ousados, pois 2012 foi um ano marcado pelo grande número de ameaças de atentados a servidores da Segurança Pública, do Sistema Prisional e do Judiciário, prédios públicos etc.
Em 26 de outubro de 2012, ocorreu o homicídio da Agente Penitenciária Dei- se Alves, esposa do Agente Penitenci-
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ário Carlos Alves, então diretor da Pe- nitenciária de São Pedro de Alcântara, considerada “sede” do PGC, e, no mês seguinte (novembro), ocorreu a primeira onda de atentados no estado. Somente de 12 a 23 de novembro de 2012, a Polícia Militar registrou “69 ocorrências noEstado,dasquaisamaioriafoi incên- dioaônibuseaautomóveis particula- res”, conforme Costa (2014), que cita dados da Agência Central de Inteligên- cia da Polícia Militar de Santa Catarina (ACI/PMSC), os quais foram divulgados nos meios de comunicação pelo Centro de Comunicação Social da PMSC”.
O número de ocorrências dessa nature- za em Santa Catarina atribuídas à facção criminosa foi considerada alarmante, o que fez que, em dezembro de 2012, fosse formalizada a criação do Grupo de Análise e Monitoramento das Organiza- ções Criminosas (GRAMFACRIM), no qual, além da DINF/SJC e da Diretoria de Informação e Inteligência da Secre- taria de Segurança Pública (DINI/SSP) como membros natos, constam: De- partamento de Administração Prisional (Deap), Agência Central de Inteligência da Polícia Militar de Santa Catarina (ACI/ PMSC), Diretoria de Inteligência da Polí- cia Civil da Polícia Civil de Santa Catarina (DIPC/PCSC), Grupo de Atuação Espe- cial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), Diretoria de Investigações Criminais (DEIC/PCSC), S-2 do Exérci- to Brasileiro, Agência Brasileira de Inte- ligência – Superintendência Estadual de SC (Abin/Sesc), Núcleo de Inteligência da Polícia Federal (PF/SC), Núcleo de Inteligência da Polícia Rodoviária Federal (PRF/SC) e Tribunal de Justiça.
A criação do GRAMFACRIM foi deter- minante para a o processo decisório, tanto para cada instituição representada, quanto para, juntas, subsidiassem o pró- prio Governo do Estado, o maior toma- dor de decisão estadual.
Ainda abalado pela onda de atentados, o estado catarinense, mais uma vez, é vítima das ações do PGC. Dessa vez, desde a noite de 30 de janeiro até 25 de fevereiro de 2013, a Polícia Militar con- firmou 111 ocorrências, “onde foram incendiados,disparadostirose jogados coquetéis molotov contra prédios pú- blicos.Asocorrênciasforam registradas em37municípios” conforme continua Costa (2015).
A situação calamitosa em que se apre- sentava o território catarinense ficou ainda mais evidenciada pela exploração midiática, conforme apontado por Oe- chsler e Hoffmann (2014): no primeiro ciclo de atentados, que durou 10 dias, o Diário Catarinense (DC) dedicou nove páginas somente ao assunto, “ desta- candoasocorrênciasentresi,a audá- ciados‘bandidos’emafrontara polícia, aprecariedadedosistemaprisionale a fragilidadedoEstadofrenteao suposto crimeorganizado”. E acrescentam que, nas edições seguintes, “ojornal continua adestacarosataqueseaaudácia dos agressores,expondoasforçaspoliciais e asdeInteligênciadoestadocomo vulne- ráveisaocrimeorganizado ”.
Oechsler e Hoffmann (2014), referindo- -se ao enfoque midiático do DC, acres- centam que “maisumavezas representa- çõesdaineficáciadoEstado,tanto como garantidordasegurançada população,
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O sistema de inteligência penitenciária e a análise e o monitoramento de organizações criminosas atuantes em Santa Catarina
quantopelaincapacidadede administrar osistemapenaldentrodascadeias” [...] e completam: “Destavez,as represen- taçõesdemedoe,porconseguinte, a sensaçãodeinsegurança,ambas disse- minadaspelojornal,vêmdafalência do sistemaprisional [...].”
O Governo Federal, em auxilio, dispo- nibilizou 40 vagas no SPF para presos catarinenses, além de colocar a Força Nacional de Segurança à disposição. O estado decidiu ocupar as 40 vagas trans- ferindo presos de UP de seis municípios de SC para Penitenciarias Federais, na maior operação do gênero feita entre o estado e a União.
Certamente, essa ação contribuiu para a desarticulação imediata do PGC, contu- do contribuiu também para que o PCC, maior Organização Criminosa do Brasil, oriunda do Estado de São Paulo e con- siderada rival do PGC, começasse a se expandir, começando por exigir espaços exclusivos dentro das Unidades Prisio- nais de SC, além, é claro, da briga por território extramuros.
Escopo e Categorias da Atividade de Inteligência
Gonçalves (2009, p. 21) nos faz a per- gunta: qual o escopo da Atividade de Inteligência? E, nesta abordagem, o pró- prio autor responde:

O escopo da atividade de inteligência diz respeito à obtenção e análise de informa- ções que venham a subsidiar o processo decisório de diferentes níveis e atividades. Daí que praticamente tudo pode ser ob- jeto de análise de informações: questões de política externa, assuntos internos, problemas estratégicos contemporâneos,
temas fiscais, segurança pública, produ- ção industrial e agrícola, meio ambiente, epidemias e saúde pública, política ener- gética. (Gonçalves, 2009, p. 21)
[...] discordamos quando as autoras se referem ao
combate às facções como uma tarefa a ser executada “ com açõesprópriasda atividade deInteligênciade segurança públicaepolicial”, pois não é somente com Inteligência de segurança pública e policial, mas também com a Inteligência Penitenciária, por esta possuir
papel fundamental na análise e no monitoramento das organizações criminosas.
No que se refere a categorias de In- teligência, Gonçalves (2009), na sua pesquisa, cita Richelson (1995), que relaciona algumas categorias de inteli- gência: política, militar, científica e téc- nica, sociológica, econômica e ambien- tal. Cita também O’Brian etal (2005), que relacionam outras categorias de inteligência: inteligência nacional, inte- ligência estratégica, inteligência tática, inteligência externa, inteligência domés- tica ou externa[...]. Na sua pesquisa, Gonçalves conclui que:
Pode-se identificar um número mais am- plo de categorias: inteligência militar, inteligência policial (associada à análise criminal), inteligência fiscal, inteligên- cia econômica e financeira, inteligência competitiva, inteligência estratégica e, no cerne da atividade, a inteligência gover- namental ou de Estado, a qual pode ser
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subdividida em interna e externa. Relem- bramos que essa classificação não é pací- fica, mas o que deve ser registrado é que as diferentes modalidades muitas vezes se inter-relacionam e têm como escopo a obtenção de informações para assesso- rar um determinado processo decisório e neutralizar a inteligência adversa. [Grifo nosso]. (GONÇALVES, 2009, p. 23)
Observou-se que Genena e Cruz (2014) discorreram as suas pesquisas voltadas para a Atividade de Inteligên- cia e a Organização Criminosa PGC e, sobre essas duas temáticas, as autoras concluem que:
No Estado de Santa Catarina desde o final de 2012, observou-se a movimentação de todo o aparato estrutural do Estado, relativo à segurança pública, o qual uniu forças no combate à facção criminosa PGC desenvolvendo em especial, ativida- des de Inteligência e investigação criminal que propiciaram a instauração de proces- sos penais contra os membros do PGC envolvidos com os atentados que assola- ram o Estado, tendo também assessorado as autoridades competentes em todo o processo decisório que envolveu a trans- ferência de lideranças da organização criminosa para unidades prisionais fede- rais. [...] o combate às facções criminosas representa uma tarefa difícil e constante, que deve ser executada permanentemen- te, dentro dos preceitos legais, e com ações próprias da atividade de Inteligên- cia de segurança pública e policial. [grifo nosso]. (Genena e Cruz, 2014).
Embora concordemos que foi imprescin- dível a união de forças entre as institui- ções no que tange ao combate à facção PGC, discordamos quando as autoras se referem ao combate às facções como uma tarefa a ser executada “com ações própriasdaatividadedeInteligência de segurançapúblicaepolicial”, pois não é somente com Inteligência de segurança
pública e policial, mas também com a In- teligência Penitenciária, por esta possuir papel fundamental na análise e no moni- toramento das organizações criminosas.
Acrescenta-se, ainda, que é no Sistema Prisional em que a grande maioria dos líderes das organizações criminosas se mantém e, ainda que seja por meio dos visitantes (advogados e familiares), co- municam-se extramuros com comparsas, passando ordens relacionadas ao mun- do do crime, destacando o tráfico de drogas, que desencadeia outros crimes, como roubos, furtos, homicídios, falsida- de ideológica etc.
Isso ficou claro diante dos episódios das ondas de atentados ocorridas no estado, cujas ordens partiram de dentro de uni- dades prisionais, das lideranças do PGC, o que as colocou no banco dos réus. Fo- ram atribuídos ao PGC os ataques, com 98 pessoas denunciadas. O resultado desses eventos foi o maior julgamento da história de Santa Catarina, que, após um ano e três meses, condenou 80 pessoas, conforme relata Silva (2014):
Um ano e três meses depois da segun- da onda de ataques em Santa Catarina, a Justiça condenou 80 acusados de en- volvimento nos atendados de fevereiro de 2013 e novembro de 2012 no Estado. Apenas três dos 83 denunciados pelo Ministério Público foram absolvidos pela 3ª Vara Criminal de Blumenau. Somadas, as penas chegam a 1.049 anos [...]
As penas duras ao Primeiro Grupo Catari- nense (PGC), apontado como responsável pelos ataques, [...] Apesar de não ser a primeira condenação dada à facção crimi- nosa, esta é a mais representativa pela atu- ação da organização criminosa no Estado, que colocou fogo em ônibus e atentou contra prédios públicos. (SILVA, 2014).
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O sistema de inteligência penitenciária e a análise e o monitoramento de organizações criminosas atuantes em Santa Catarina
Destaca-se a Atividade de Inteligência Penitenciária, desenvolvida pela Direto- ria de Inteligência e Informação da SJC como parte essencial da produção de co- nhecimento que contribuíu sobremaneira para o processo decisório no âmbito da SJC, com a manutenção da ordem e da paz nas Unidades Prisionais, e das insti- tuições ligadas à Segurança Pública en- volvidas nesse contexto, além do Gover- no do Estado, na condição de principal tomador de decisão.
Conclusão
É pertinente destacar que é comum en- contrar na literatura pesquisas sobre Or- ganizações Criminosas, as quais apon- tam as suas origens e ações diretamente
da Receita Federal do Brasil, Ministério Público da União, etc.) e dos municípios (Guardas Municipais), facilmente se veri- fica que há, desenvolvidas ou embrioná- rias, mais de 150 ‘Agências’ ou ‘Servi- ços’ de inteligência brasileiros, das quais mais da metade surgiu ou desenvolveu- -se nos últimos oito anos. (FEITOZA, 2009). (Grifo nosso).
No seu curto período de existência, a DINF vem se consolidando como um exemplo positivo no seu modelo de implantação. Entre as Agências de In- teligência Penitenciárias visitadas pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), a de Santa Catarina é que mais se destaca, Mingardi (2016), responsá- vel pelo diagnóstico realizado para o Depen aponta “aInteligência Penitenci- áriadeSantaCatarinacomoamelhor do
relacionadas às Unidades Prisionais. É país”1 e justifica seu diagnóstico base-
comum, também, encontrar pesquisas sobre Atividade de Inteligência nas quais são elencadas várias categorias de Inteli- gências, contudo, em tais pesquisas, não é identificada a Inteligência Penitenciária, ainda que esta se apresente interagindo com os demais órgãos de Segurança Pública. Na obra de Gonçalves (2009), por exemplo, apenas na Apresentação da Série, assinada por Delilson Feitoza o mesmo vislumbra o crescimento da Atividade de Inteligência nas instituições brasileiras e considera que:
Há vinte e sete unidades federativas no Brasil, cada uma com Polícia Civil, Po-
lícia Militar, Ministério Público, Corpo de Bombeiros Militar, Sistema Prisional e Secretaria da Fazenda, além dos órgãos da União (Exército, Marinha, Aeronáuti- ca, Ministério da Defesa, Abin, Secretaria
ado “na organização, na qualidade de serviços, na capacidade de planejamen- to, na realização da atividade de análise de análise e na capilaridade, pois con- templa núcleos de Inteligência em todas as unidades prisionais”.
A DINF atua buscando mostrar cenários, prever e prevenir ações adversas contra os Sistemas Prisional e Socioeducativo, para que os seus decisores, para os quais a DINF é o órgão de assessoramento, possam atuar de forma proativa em bus- ca de melhorias e políticas públicas que venham a minimizar as ações do crime organizado e maximizar o interesse na ressocialização do indivíduo recluso.
Por essa ótica, a disponibilidade de diag- nósticos e prognósticos sobre a evolução

1 Informação fornecida por Guaracy Mingardi, Coordenador da mesa “Construção da ordem nas prisões brasileiras: encarceramento, violência e facções criminais”, no 10º Encontro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em Brasília/DF, em 22 de setembro de 2016, na UnB.
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de situações relacionadas às organiza- ções criminosas atuantes em Santa Ca- tarina é considerada um diferencial para o processo decisório no âmbito da Se- cretaria de Estado da Justiça e Cidadania (SJC), e a Visão definida pela DINF vem ao encontro do Princípio da Interação, que aponta que sejam estabelecidas re- lações sistêmicas de cooperação entre as instituições, de modo a se otimizar es- forços para atingirem os seus objetivos.
SPF é prejudicial pela ousadia com que esses presos retornam ao estado a cada dois anos, no máximo. Por outro lado, o enfraquecimento do PGC durante esse período pode ser favorável ao oportunis- mo de novas facções criminosas contrá- rias ao PGC e, também, ao próprio inte- resse da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) em ocupar o espaço do PGC dentro do Sistema Peni- tenciário e fora dele, conforme discorre
[...] nas atividades voltadas a todos os aspectos que permeiam as organizações criminosas, a Inteligência Policial, a Inteligência Criminal e a Inteligência de Segurança Pública estão concatenadas com a Inteligência Penitenciária, que se apresenta não apenas como um importante instrumento do Sistema de Segurança Pública do estado, mas também, como um elo entre a temática Organização Criminosa x Segurança Pública.
É inevitável buscar-se uma reflexão so- bre a importância do estado, ao dar res- posta, naquele momento, não somente à sociedade catarinense, mas também à sociedade brasileira, e, ainda, resposta ao próprio PGC, com a maior transfe- rência já realizada para o Sistema Peni- tenciário Federal. Contudo, ainda não é possível mensurar os resultados futuros dessa transferência, pois, por um lado, a história tem mostrado que o convívio no
Vargas (2015):
[...] a presença no Estado da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, ganhou proporções de alta preocupação na segurança públi- ca catarinense nos últimos dias. [...]
Historicamente, a facção paulista nunca se consolidou no Estado graças a pre- sença do Primeiro Grupo Catarinense (PGC), a maior facção criminosa de San- ta Catarina, desarticulada em 2013 após a transferência de 40 criminosos líderes para presídios federais.
[...] Em abril de 2013, [...] o DC anteci- pou com exclusividade que criminosos do PGC não aceitavam batismos do PCC no sistema prisional de Santa Catarina e pre- viam banho de sangue caso os paulistas insistissem no domínio. (VARGAS, 2015).
Conforme é possível se perceber, é im- prescindível que o Sistema Prisional re- presentado pela Secretaria de Justiça e Cidadania, mantenha-se subsidiado pelo seu órgão de Inteligência, bem como que continue o processo de interação com os órgãos de Segurança Pública, e busque neutralizar ou minimizar os reflexos ne- gativos da atuação de organizações cri- minosas no território catarinense.
Conclui-se destacando-se que, nas ati- vidades voltadas a todos os aspectos
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O sistema de inteligência penitenciária e a análise e o monitoramento de organizações criminosas atuantes em Santa Catarina
que permeiam as organizações crimino- sas, a Inteligência Policial, a Inteligência Criminal e a Inteligência de Segurança Pública estão concatenadas com a Inte- ligência Penitenciária, que se apresenta
não apenas como um importante instru- mento do Sistema de Segurança Pública do estado, mas também, como um elo entre a temática Organização Criminosa x Segurança Pública.
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